Segundo Ulises, Claudia dizia, aquela célebre parábola de Jesus Cristo, a dos ricos, do camelo e do olho da agulha, poderia ser fruto de um erro de grafia. Em grego, Claudia disse que Ulises dissera (mas desde quando Ulisses sabia grego?) que existiam a palavra káundos, camelo, mas o ene (eta) lia-se quase como i, e a palavra káuidos, cabo, amarra, corda grossa, em que o i (iota) se lê i. O que o levara a indagar se, assim como Mateus e Lucas se basearam no texto de Marcos, a origem do possível erro ou lapso não estaria nele ou num copista imediatamente posterior a ele. A única coisa que se poderia objetar, Claudia repetia o que Ulises tinha dito, era que Lucas, bom conhecedor do grego, teria corrigido o erro. Pois bem, Lucas sabia grego, mas não conhecia o mundo judaico, e pode ter suposto que o "camelo" que entra no olho da agulha era um provérbio de origem hebraica ou aramaica. O curioso, segundo Ulises, é que havia outra origem possível do erro: segundo o herr professor Pinchas Lapide (que nome, Claudia comentou), da Universidade de Frankfurt, especialista em hebraico e aramaico, no aramaico da Galiléia havia provérbios em que se usava o substantivo gamta, corda de embarcação, e, se uma das das suas consoantes fosse escrita de maneira errada, como acontece com frequência em manuscritos hebraicos e aramaicos, seria muito fácil ler gamal, camelo, principalmente levando em conta que, na escrita do aramaico e do hebraico antigos, não se usam vogais, elas precisam ser "intuídas". O que nos levava, Claudia dizia que Ulises tinha dito, a uma parábola menos poética e mais realista. É mais fácil uma corda de barco ou uma corda grossa entrar pelo olho de uma agulha do que um rico ir para o reino dos céus. Qual era a parábola que ele preferia?, Daniel perguntou. Nós dois sabíamos a resposta, mas esperamos que Claudia a dissesse. A do erro, evidentemente.