Aline 🌷 finished reading Amêndoas by Won-pyung Sohn
Amêndoas é narrado em primeira pessoa pelo personagem Yunjae, um adolescente da Coreia do Sul que mora com a mãe e a avó. Yunjae é acometido pela alexitimia, condição caracterizada pela dificuldade de identificar - em si mesmo e nos outros - e expressar emoções. Devido a essa condição, desde criança sua mãe o submete a treinos caseiros para que consiga fazer atividades cotidianas em seu pequeno núcleo social ou mesmo para sobreviver - aprendendo por treino a sair da frente de carros vindo em sua direção, por exemplo. Por consequência desse treinamento, o personagem consegue lidar com as situações do cotidiano de maneira quase comum, até que uma tragédia acontece e ele subitamente precisa seguir a vida sem a presença de sua mãe e sua avó. Yunjae acaba se aproximando de Gon, adolescente que teve uma infância repleta de desafios dos quais tenta esconder as marcas emocionais. A interação entre eles será permeada por adversidades e por situações nunca antes experienciadas pelo personagem principal.
Por ser muito interessada em quaisquer aspectos envolvendo emoções e por estar curiosa para aprender sobre a alexitimia, eu estava com altas expectativas com relação a essa leitura. Apesar de julgar o livro necessário, importante e bem interessante, não consegui me conectar com a história ou com o personagem da maneira que eu estava esperando. Há pelo menos dois fatores que poderiam explicar essa falta de conexão. Primeiro, acredito que esse tenha sido meu primeiro contato com literatura asiática, e diferenças culturais não podem ser descartadas ao pensar no distanciamento emocional que senti lendo este livro, já que emoções são expressas de maneiras muito distintas entre culturas. Segundo, o livro é narrado em primeira pessoa por Yunjae, portanto as situações são descritas de maneira objetiva e sem o viés emocional. Por um lado, foi interessante ler sob o ponto de vista dele, totalmente diferente do que estou habituada, e pensar em questões sobre a alexitimia. Por exemplo, ao descrever a cena em que um personagem lhe fazia um pedido claramente carregado de emoção, Yunjae pensa que este personagem “parecia sempre precisar de tempo antes de dizer alguma coisa”. Isto levanta o questionamento se alguém que não tem acesso às suas emoções conseguiria realizar algumas das atividades cotidianas - exceto talvez situações de ameaça real à sobrevivência - com mais agilidade. Outro trecho que me fez refletir foi: “A mamãe que compartilhava os detalhes de minha vida e os da dela com outra pessoa não era a mamãe que eu conhecia. Foi um alívio saber que ela tinha com quem conversar, afinal”. Esse trecho é apenas um dos vários que mostram que ele conseguia sentir algumas coisas, e que talvez soubesse - intelectualmente - sobre a importância de conversar sobre sentimentos, apesar de não entender emocionalmente o que isto significava na prática. Também me fez pensar que pessoas com alexitimia talvez não sejam os melhores ouvintes para desabafos emocionais.
Apesar de ter proporcionado esses e outros questionamentos, minha experiência de leitura não me pareceu tão rica quanto eu estava esperando. Senti uma falta de conexão com a história e o narrador. Embora ele experiencie uma tragédia e passe por diversas situações emocionalmente pesadas, a falta de demonstração de que se importava com essas situações fez com que eu me sentisse distante do personagem na maior parte da leitura. Achei muito mais interessante ler a nota da autora no final do livro acerca das motivações que a levaram a escrevê-lo do que a estória em si. Uma dúvida que surgiu é que apesar de ter lido pouco sobre o assunto, entendo a alexitimia como sendo uma dificuldade de identificar e expressar emoções. Na maior parte dessa estória, porém, tive a impressão de que o personagem não apenas tinha dificuldade de identificar/expressar, mas que ele não sentia. Talvez por isto estar muito incompatível com a minha realidade, me causou tanta estranheza. E talvez essa seja justamente a riqueza do livro, já que apresenta uma realidade tão diferente.
Essa obra me fez descobrir que o que busco em uma leitura não se restringe ao conhecimento ou à possibilidade de viajar para outros universos e viver outras possibilidades. Também busco emoções. Busco estar conectada emocionalmente com os personagens. Não bastando, a obra evidenciou que avalio livros baseando-me nas emoções sentidas durante a leitura, e é por esse motivo que darei apenas três estrelas. Entretanto, apesar da minha experiência pessoal com essa leitura - que foi incongruente com as minhas expectativas -, considero esse livro não só importante mas necessário. De maneira geral, pensar de forma diferente da qual estamos habituados é sempre um exercício riquíssimo. Mais especificamente, o livro traz a possibilidade de aprender um pouco ou pelo menos saber sobre a existência da alexitimia, uma condição ainda tão pouco conhecida. Apesar de ter pesquisado, não consegui encontrar outras obras de ficção que retratem essa condição. O livro também aborda outros temas importantes, como o bullying, a violência, o abandono, a aceitação social e os desafios da parentalidade, todos trazendo margem para diversas reflexões e questionamentos. Se fosse atribuir uma nota a esse livro de acordo com o quanto o julgo importante, ele não receberia menos que quatro estrelas. Por isso, espero que a minha nota não desencoraje a leitura, já que essa atribuição é baseada unicamente na minha experiência emocional, e não na importância da obra, tampouco na possibilidade de aprendizado e reflexões, muito menos na qualidade técnica do livro. Contudo, seria incompatível com o meu funcionamento atribuir uma nota desconsiderando a minha experiência emocional de leitura, e é apenas por isso motivo que atribuo apenas três estrelas. Isso não significa que eu não tenha sentido nada durante a leitura. O livro proporcionou momentos instigantes - como a cena do filho do lojista no início da narrativa - e aterrorizantes - como a cena da borboleta. Mas, de maneira geral, não me ofereceu a riqueza de emoções que eu estava esperando. Mesmo assim, indico a leitura, e acredito que tenha o potencial de agradar outros leitores, ou de, no mínimo, informar sobre a alexitimia e trazer reflexões sobre os outros temas importantes que são apresentados.