"Limite de Caracteres – Como Elon Musk destruiu o Twitter" (Character Limit, 2024, 488 pgs.) é um livro-reportagem sobre o X/Twitter, focado em sua tomada por Elon Musk, escrito pela dupla de repórteres de tecnologia do New York Times, Kate Conger e Ryan Mac.
Adorei a leitura por desmistificar a suposta genialidade desse bilionário. Na biografia autorizada de Musk, de Walter Isaacson, ele é quase endeusado dessa maneira. Já em Limite de Caracteres, aparece como alguém que nutre uma ideia extremamente inflada de si, alienado da realidade, que não admite ouvir “não” e que basicamente não tem ideia do que está fazendo.
Sabe aquela pessoa que imagina estar cercada de idiotas e que a única maneira de fazer algo bem feito é mostrando aos “idiotas” como fazer? A sucessão ininterrupta de trapalhadas narrada no livro acaba sendo hilária porque Musk parece viver 100% nesse tipo de fantasia, sem desconfiar que o idiota talvez seja ele mesmo.
Por exemplo, tendo que mudar um datacenter de lugar, ele não se conforma com os cuidados que precisam ser tomados e o tempo que levaria. Então, decide ele mesmo, com um sobrinho e outros seguidores, enfiar os servidores em caminhões e fazer a mudança. O resultado foi meses de lentidão e falhas no serviço em todo o mundo, até conseguirem consertar a mudança mal feita.
Musk basicamente tenta restruturar o Twitter seguindo a mesma fórmula — de cortes radicais, e ideias espontâneas — com que administra suas outras empresas, “afinal, (o Twitter) é só um site que rola para baixo”. Imagina que seria uma tarefa simples, mas falha miseravelmente, vez após outra. Chega a dar dó de tamanha falta de noção e alienação.
Uma personagem da história também simplifica as empresas do bilionário, dizendo algo como: “A SpaceX é uma questão de física; a Tesla, de fabricação; mas a lógica do Twitter é psicológica e social”. Talvez seja por isso que ele não consegue acertar uma, além do fato de ele mesmo ser um viciado terminal em ficar postando e conferindo reações na plataforma.
Em certo momento, ele não se conforma de que o número de visualizações de cada tweet seu caiu de 20 milhões para seis milhões. Marca reuniões de emergência, demite quem insinua que as pessoas podem estar perdendo interesse nele e termina alterando o algoritmo para que todo mundo que usa a plataforma veja seus tweets. No final, foi mais ou menos para isso que ele pagou o preço inflado de 44 bilhões de dólares — hoje, a empresa desvalorizou 80%.
Uma qualidade do livro é se ater ao formato de reportagem, a dupla de autores evita ficar tecendo comentários. Cada fracasso é descrito de forma até que bastante objetiva, do ponto de vista das pessoas próximas ou que trabalhavam na empresa.
Jamais imaginei que leria uma biografia — muito menos duas! — de Musk. Mas é um personagem tão emblemático da atual distopia — em que existem milhões de fãs de produtos, corporações e até de bilionários — que não resisto.
Li a versão em inglês do livro, cuja tradução será lançada nos próximos dias.