Thamiê Stella reviewed Coração das Trevas
O horror!
4 stars
Content warning Detalhes da trama
Coração das Trevas é um livro contraditório. Ao mesmo tempo que o relato quase autobiográfico de Joseph Conrad traz elementos racistas em sua análise e descrição aos africanos colonizados por britânicos, o autor - sob a narração em primeira pessoa do protagonista - faz críticas ao colonialismo europeu e tece uma interessante análise psicológica, utilizando a impenetrável e imponente selva africana como metáfora e síntese dos confins mais assustadores da mente humana. Ao traçar a jornada do recém contratado Capitão Marlow pelo rio Congo atrás do famoso General Kurtz, Conrad vai aos poucos descrevendo uma jornada rumo ao inferno. Mas este inferno não é geográfico, e sim psicológico. Sua odisseia parece caminhar até um destino idealizado: a figura de Kurtz, endeusada por aqueles que o conhecem. Kurtz durante boa parte do livro é uma imagem, um ideal. O encontro de Marlow com o verdadeiro Kurtz não só quebra essa imagem como também deturpa todo o conceito que os colonizadores tem sobre si. Tido como o melhor dentre seus homens, Kurtz apresenta traços de psicopatia e megalomania, e transforma a área que controlava para tráfico de marfim em uma seita onde ele é a divindade. Embora diga-se que as trevas da selva o transformaram, o próprio capitão Marlow não acredita: "A floresta o havia possuído logo de início e lhe imposto uma vingança por sua absurda invasão. Acredito que ela tenha sussurrado em seus ouvidos coisas sobre si que ele mesmo não sabia, e que só veio a conhecer quando teve contato com aquela grande solidão. Por esse motivo, o sussurro se tornou fascinantemente irresistível e ecoou intensamente dentro dele, pois seu íntimo estava completamente vazio." (p. 134) A edição da Lafonte é bem simples, porém pelo seu baixo custo vale à pena. A tradução de Karine Simões é muito boa.