A repetição é a característica essencial do ritual. Ela se distingue da rotina pela sua capacidade de produzir uma intensidade. De onde vem a intensidade que marca a repetição e a protege da rotinização? Repetição e lembrança constituem o mesmo movimento para Kierkegaard, mas em direções opostas. O que é lembrado é algo passado, sendo "repeti- do para trás", enquanto a repetição autêntica "lembra pra frente"". A repetição como reconhecimento é, portanto, uma forma de união, de término. Passado e futuro são unidos em um presente vivo. Como forma de união, pro- move duração e intensidade. Zela para que o tempo permaneça. Kierkegaard opõe a repetição tanto à es- perança quanto à lembrança: "A esperança é uma nova peça de roupa, rígida, lisa e brilhan- te, mas a gente nunca a vestiu e não sabe como fica vestida, nem seu caimento. A lembrança é uma peça de roupa usada muito bonita, mas que não cabe mais, porque a gente cresceu. A repetição é uma roupa que não se desgasta, bem ajustada, mas delicada, que não aperta ou faz trepidar". É apenas "o novo", diz Kierke- gaard, "que nos dá fastígio, nunca o velho". O velho é o "pão diário que me sacia com bênção". Ele alegra: "Apenas é feliz de fato quem não trai a si mesmo imaginando que a repetição deveria ser algo novo, pois então se iria ficar farto dela"
— O desaparecimento dos rituais by Byung-Chul Han (Page 20 - 21)