Todos os fenômenos são no tempo, no qual, como substrato (como forma persistente da intuição interna), tanto a simultaneidade quanto a sucessão534 podem exclusivamente ser representadas. O tempo, portanto, no qual é para ser pensada toda mudança B225 dos fenômenos, perdura e não muda535, posto que é aquilo em que a sucessão ou a simultaneidade536 podem ser representadas apenas como determinações dele. Ora, o tempo não pode ser percebido por si. Resulta que é nos objetos da percepção, isto é, nos fenômenos, que tem que ser encontrado o substrato que representa o tempo em geral e no qual toda mudança ou simultaneidade são perceptíveis na apreensão mediante a relação dos fenômenos com ele. O substrato, porém, de todo real, isto é, de tudo que pertence à existência das coisas, é a substância, da qual tudo pertencente à existência pode ser pensado somente como determinação. Daí o persistente, em relação ao qual exclusivamente podem ser determinadas todas as relações temporais dos fenômenos, é substância no fenômeno, isto é, o real nele, o qual, como substrato de toda mudança, permanece sempre o mesmo. Como, portanto, este não pode mudar na existência, sua quantidade na natureza igualmente não pode ser nem aumentada nem diminuída.
Nossa apreensão do múltiplo do fenômeno é sempre sucessiva, sendo, portanto, sempre mutável. Consequentemente, jamais podemos determinar exclusivamente através disso se esse múltiplo, como objeto da experiência, é simultâneo ou sucessivo se algo não lhe dá fundamento, que sempre existe, isto é, algo duradouro e persistente,537 do que toda mudança e simultaneidade B226 não são senão tantos quantos modos (modi do tempo), no que o persistente existe. Portanto, somente no persistente são possíveis relações temporais (com efeito, simultaneidade e sucessão são as únicas relações no tempo), A183 isto é, o persistente é o substrato da representação empírica do próprio tempo, pelo que exclusivamente é possível toda determinação temporal. A persistência expressa, em geral, o tempo como o correlato constante de toda existência dos fenômenos, toda mudança e toda simultaneidade538. Com efeito, a mudança não afeta o próprio tempo, mas tão só os fenômenos no tempo (tal como a simultaneidade não é um modus para o próprio tempo em que as partes não são simultâneas, mas se sucedem todas). Fosse para atribuir tal sucessão ao próprio tempo, e seria necessário pensar ainda outro tempo no qual seria possível essa sucessão. Exclusivamente através do persistente, a existência em distintas partes da série temporal adquire uma grandeza, que se denomina duração539. Com efeito, na mera sucessão, isoladamente, a existência está sempre desvanecendo e surgindo e jamais tem a mínima grandeza. Sem esse persistente, portanto, não existe nenhuma relação temporal. Ora, o tempo não pode ser percebido em si mesmo; consequentemente, esse persistente nos fenômenos é o substrato de toda determinação temporal, do que resulta ser também a condição da possibilidade de toda unidade sintética das percepções, isto é, da experiência, e nesse persistente B227 toda existência e toda mudança no tempo só podem ser consideradas um modus da existência daquilo que dura e persiste. Assim, em todos os fenômenos, o persistente é o próprio objeto, isto é, a substância (phaenomenon), mas tudo o que muda ou que pode mudar A184 pertence somente à maneira como essa substância ou substâncias existem e, portanto, às suas determinações.
— Crítica da Razão Pura by Immanuel Kant (Page 178 - 180)