Miguel Medeiros quoted Batismo de sangue by Frei Betto
“Os brasileiros estão diante de uma alternativa” – escreveu Marighella em Por que resisti à prisão. “Ou resistem à situação criada com o golpe de 1º de abril ou se conformam com ela (...) Antes tínhamos a chamada democracia representativa. Nela, a inflação prosseguia em sua marcha acelerada. Os trustes norte-americanos mandavam. O latifúndio predominava. Milhões de homens do povo não podiam votar. Analfabetos e praças não tinham o direito de voto. Os comunistas não podiam ser eleitos, ainda que pudessem votar. Era uma democracia racionada. E racionada por isso. Porque os direitos individuais pelo menos eram respeitados, mas as restrições à participação do povo nessa democracia eram flagrantes. E injustas. Tal democracia, pela sua própria estrutura, constituía por si mesma um empecilho à realização das reformas sociais – as chamadas reformas de base. E, por mais que oferecessem oportunidades – amparando os direitos individuais –, sentia-se emperrada. E não podia avançar pacificamente. Como de fato não avançou; e acabou golpeada. As forças de direita e o fascismo militar brasileiro deram-lhe o tiro de misericórdia.” “O que havia de errado nesse tipo de democracia vinha de longe. Era um vício de origem. Um pecado original. Não se tratava de uma democracia feita pelo povo. Quem a instituiu foram as classes dirigentes. Nesse arcabouço erigido pelas elites, as massas conquistaram alguns direitos, ali introduzidos graças às suas lutas. Historicamente o mal dessa democracia era, acima de tudo, o seu conteúdo de elite, com a ostensiva marginalização das grandes massas exploradas – o proletariado crescendo sem nunca chegar à integração de direitos exigida pelo seu papel na produção. E os camponeses inteiramente por fora – párias da democracia – sob a ultrajante justificativa de sua condição de atraso e suprema escravização aos interesses dos senhores da terra.”
— Batismo de sangue by Frei Betto (Page 36 - 37)