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Frei Betto: Batismo de sangue (Paperback, Português language, Rocco) No rating

Lançado originalmente em 1982, Batismo de sangue ganhou o prêmio Jabuti na categoria de melhor …

Em 1966, Marighella escreveu A crise brasileira, trabalho teórico no qual analisa a conjuntura nacional a partir da estrutura de classes em nosso país – baseado nas obras de Nelson Werneck Sodré – e critica o Partido por resguardar-se de qualquer atividade consequente, acomodado na ilusão de um processo eleitoral limpo e, ao mesmo tempo, refratário ao divórcio da burguesia. “Quando a liderança do proletariado se subordina à liderança da burguesia ou com ela se identifica”, escreveu, “a aplicação da linha revolucionária sofre inevitavelmente desvios para a esquerda e a direita.” Após identificar os erros do Partido, como “o reboquismo” ao governo, “a perda do sentido de classe”, defendia a organização do movimento de massas, a “frente única antiditadura”, não para “visar, nas condições atuais, a pressão sobre o governo... O objetivo do movimento de massas é levar a ditadura à derrota, substituí-la por outro governo”. Admitia que “o caminho pacífico está superado (...) Sem uma estratégia revolucionária, sem a ação revolucionária apoiada no trabalho pela base e não exclusivamente de cúpula, é impossível construir a frente única, movimentar as massas e dar-lhes a liderança exigida para a vitória sobre a ditadura”. Essa estratégia apoiava-se no proletariado, nas massas rurais, nos intelectuais e nos estudantes, “as forças básicas da revolução”. Malgrado suas desilusões, não advogou o abandono de certas alianças com a burguesia, embora sublinhasse que “não pode ser o trabalho fundamental (...) O trabalho mais importante, aquele que tem caráter prioritário, é a ação no campo, o deslocamento das lutas para o interior do país, a conscientização do camponês. No esquema estratégico brasileiro, o pedestal da ação do proletariado é o trabalhador rural. A aliança dos proletários com os camponeses é a pedra de toque da revolução brasileira”. Ao retomar “o princípio da unidade e luta com a burguesia dentro da frente única”, o autor referiu-se, numa frase, à questão que merecera menção passageira no texto anterior: “Um dado valioso para essa unidade – tendo em vista atrair o centro – é a aliança com os católicos e, em particular, com a esquerda católica.” A parte final do texto foi dedicada às “Guerrilhas como forma de luta”. Acreditava Marighella que “a  luta de guerrilhas é – no caso brasileiro – uma das formas de luta de resistência das massas. As guerrilhas são uma forma de luta complementar. Em si mesmas elas não decidem a vitória final”. Entendia, naquele momento, “que a luta de guerrilhas não é inerente às cidades, não é uma forma de luta apropriada às áreas urbanas. A luta de guerrilhas é típica do campo, das áreas rurais, onde há terreno para o movimento, e onde a guerrilha pode expandir-se”. Sua utilização não dispensava “as mínimas possibilidades legais [de luta] nos vários terrenos, inclusive no eleitoral e no jurídico”. Todavia, não pensava em focos guerrilheiros de extração pequeno-burguesa: “Nada parece aprovar a ideia de uma luta de guerrilhas que não surja das entranhas do movimento brasileiro. A mais perfeita identificação com os camponeses, em seus usos, costumes, trajes, psicologia, constitui fator de decisiva importância... A natureza peculiar da guerrilha, pelo seu cunho irregular e pelo desapego a todo e qualquer convencionalismo militar, é incompatível com princípios táticos que não encontrem por parte do povo amparo, cobertura, apoio e a mais extensa e profunda simpatia.” No parágrafo final, deixou clara a sua posição frente ao foquismo propalado a partir das interpretações que Régis Debray – filósofo francês que acompanhou Che Guevara nas matas da Bolívia – fizera da revolução cubana: “Ninguém espera que a guerrilha seja o sinal para o levante popular ou para a súbita proliferação de focos insurrecionais.” A história, entretanto, não é como um trem que segue o seu percurso dentro dos trilhos de nossas intenções e nem obedece as horas marcadas de nossas esperanças.

Batismo de sangue by  (Page 37 - 40)