Miguel Medeiros quoted Batismo de sangue by Frei Betto
Como os frades dominicanos assumiram, no Brasil, posições de esquerda? Abandonaram a fé e abraçaram o marxismo? Lobos travestidos de cordeiros revestidos de hábitos brancos? O papa João XXIII varreu, como ele mesmo disse, a poeira acumulada no trono de Pedro. Seu breve pontificado (1958-1962) abalou os alicerces da Igreja Católica. Não se pense, entretanto, que o aggiornamento brotou da cabeça do pontífice. O Concílio Ecumênico Vaticano II, convocado por ele, foi o desaguadouro do movimento de renovação fermentado no interior da Igreja ao longo da primeira metade do século XX. Na Bélgica, o padre Joseph Cardijn fundara a JOC em 1925 e, em consequência, a Ação Católica. O apostolado perdia o ranço devotivo da Congregação Mariana e adquiria uma dimensão social que levaria militantes cristãos a atuarem dentro do mundo operário, cuja perda para a Igreja fora lamentada por Pio XI (1922-1939). Os padres-operários trocavam a batina pelo macacão da fábrica, o borrifador de água benta pela ferramenta, as lições formais do catecismo pelos valores do Evangelho. As novas vocações dominicanas brasileiras eram enviadas à França para cursar filosofia e teologia. À semelhança dos jovens de Vila Rica remetidos, no século XVIII, à Universidade de Coimbra, retornavam com a cabeça prenhe de ideias progressistas. Imbuíam-se da filosofia de Maritain e da teologia do padre Congar; do pensamento militante de Emmanuel Mounier e dos exemplos de ação conjunta de marxistas e cristãos na Resistência francesa.
— Batismo de sangue by Frei Betto (Page 69)