Sei que pode parecer sacrílego que este manual de divulgação fale de economia política no estilo de um romance de amor ou de piratas. No entanto, confesso, repugna-me ler algumas obras valiosas de certos sociólogos, politicólogos, economias ou historiadores, que escrevem em código. A linguagem hermética nem sempre é o preço inevitável da profundidade. Em alguns casos pode esconder, simplesmente, a incapacidade de comunicação elevada à categoria de virtude intelectual. Suspeito de que assim o enfado, com frequência, serve para bendizer a ordem estabelecida: confirma que o conhecimento é um privilégio das elites.
Algo parecido, diga-se de passagem, costuma ocorrer com certa literatura militante dirigida a um público complacente. Parece-me conformista, a despeito da toda a sua possível retórica revolucionária, uma linguagem que mecanicamente repete, para os mesmos ouvidos, as mesmas frases feitas, os mesmos adjetivos, as mesmas fórmulas declamatórias. Talvez essa literatura de paróquia esteja bem longe da revolução quanto a pornografia está longe do erotismo.
— As Veias Abertas da América Latina by Eduardo Galeano (Page 347 - 348)