Chama-se morfema a unidade mínima significativa ou dotada de significado que integra a palavra. A depreensão do morfema ou dos morfemas que integram a palavra nem sempre constitui uma operação fácil e sujeita a uma única solução. Se tomarmos: falávamos falava facilmente depreendemos o elemento comum falava, e mos como distintivo. A unidade -mos indica estar a primeira forma verbal referida à 1.ª pessoa doplural (nós), e assim, portadora de um conteúdo gramatical, é um morfema. Se agora compararmos: falava fala, destacamos o morfema -va- que indica que a ação verbal se dá num passado que se prolonga (pret. imperfeito do indicativo). É, assim, outro morfema. Se agora compararmos: falava falara se poderia chegar à conclusão que o elemento ou unidade distintiva das duas formas verbais fosse o -v- para a primeira ou o -r- para a segunda. A comparação com outras formas (falava / fala; falara / falasse, etc.) no mostraria que as unidades a serem consideradas serão -va- e -ra-, que marcam o pret. imperf. e o mais-que-perf. do indicativo. Portanto, a depreensão de um morfema não é uma operação puramente material; há de se levar em consideração o seu conteúdo ou significado.
Tipos de morfema na estrutura das palavras Na estrutura das palavras, os morfemas derivativos e flexionais se distribuem, quanto ao aspecto formal, pelos seguintes tipos, conforme ocorram por acréscimo (aditivos), por subtração (subtrativos) e por alternância (modificativos). Em nossa língua, são mais produtivos os morfemas aditivos, ao lado das formações com compostos; são raros os subtrativos, e os modificativos ocorrem com frequência nos casos de flexão nominal e verbal, conforme veremos no lugar competente.
Morfemas aditivos Representados por: 1) prefixos: anteposição à base lexical: pôr → repor; quieto → inquieto 2) sufixos, interfixos e desinências: posposição à base lexical 3) infixos: intercalação no interior da estrutura da base 4) circunfixos: anteposição e posposição simultaneamente à base (parassintéticos) 5) descontínuos: fragmentação pela intercalação de outro morfema 6) reduplicativos: repetição da parte inicial da base
Morfemas subtrativos Representados por: 1) subtrativos: subtração de fonema do radical para exprimir uma indicação gramatical 2) supressivos: a) supressão de um segmento medial pertencente a qualquer das bases b) supressão do segmento final c) supressão de elemento medial por cruzamento de bases 3) abreviativos: redução da extensão da palavra, que passa a valer pelo todo
Morfemas modificativos Representados por: 1) apofonia: substituição de fonema vocálico de um radical de um mesmo paradigma flexional ou derivacional por mudança de timbre para indicação de significado gramatical 2) metátese: por mudança da sílaba tônica
Os morfemas podem ser classificados ainda como livres e presos, conforme apareçam independente ou dependentemente no discurso. Os morfemas apresentam: a) uma significação externa, referente a noções do nosso mundo (ações, estados, qualidades, ofícios, seres em geral, etc.), b) uma significação interna (puramente da esfera das noções gramaticais). A depreensão de um morfema depende de dois requisitos: a) a significação e b) a forma fônica. É importante observarmos que uma só forma fônica pode representar mais de um morfema: assim -s é marca pluralizadora em as casas e a 2.ª pessoa do singular em cantas. Por outro lado, um só morfema pode ter realizações fônicas diferentes em virtude do contexto fonético em que se acha; por exemplo, o morfema que corresponde à letra -s para indicar o plural em português se realiza como / x / diante de consoante surda (os cães), como / j / diante de consoante sonora (os gatos) e como / z / diante de vogal (os homens).
Os elementos mórficos Em português, as palavras se podem apresentar sob formas de estrutura diferentes: a) mar, sol, ar, é, hoje, lápis; b) aluno, alunas, trabalhávamos; c) casarão, livrinho, cantor, casamento, folhagem, alemão, fertilizar, chuviscar; d) reter, conter, deter; e) guarda-chuva, lanígero, agrícola, planalto, fidalgo.
Em a) as palavras não se podem dividir em formas menores significativas porque só possuem um elemento mórfico chamado radical. Radical é o núcleo onde repousa a significação externa da palavra, isto é, relacionada com o mundo em que vivemos. Já no grupo b) segue-se ao radical (de significação externa) um ou mais elementos de significação interna ou puramente gramatical. Aluno pode desmembrar-se em alun- e -o. O primeiro elemento (radical) encerra a significação da palavra, cabendo ao final -o primeiramente atualizá-la para funcionar como palavra, integrando-a no léxico, e secundariamente relacioná-la à marca de gênero, no caso de -o e -a (este de modo não geral, como acontece com mapa, nauta, masculinos). Em alunas o radical é alun-, e -as encerra dois elementos de significação interna: 1) -a (indicador do significado gramatical gênero feminino) e 2) -s (indicador do significado gramatical número plural). Em trabalhávamos o radical é trabalh- e os elementos mórficos de significação interna são: 1) -va (que caracteriza o pret. imperf. do indicativo dos verbos da 1.ª conjugação) e 2) -mos (que caracteriza a 1.ª pessoa do plural). Teríamos ainda a vogal temática -a-, a ser tratada mais adiante.
— Moderna Gramática Portuguesa by Evanildo Bechara (Page 366 - 368)