a tarefa do pensamento dialético não pode ser a de fazer malabarismos com os conceitos, de maneira a substituir, por debaixo do pano, aquelas determinações que um conceito possui por outras tais que porventura convenham a esse mesmo conceito. Tal caminho seria, de fato, o caminho do pensamento sofístico e não aquele do conceito dialético. Ao contrário, aquilo que é propriamente exigido da dialética segundo seu ideal - um ideal a propósito do qual, aliás, sou o último a afirmar que seja sempre alcançado em cada operação dialética - consiste muito antes em empregar os próprios conceitos de uma tal maneira, perseguir de tal modo sua coisa [Sache], sobretudo confrontar o conceito tão longamente com aquilo que se pretende dizer por meio dele, até se mostrar que entre tal conceito e a coisa, referida por meio dele, produzem-se certas dificuldades; e que tais dificuldades forçam, por seu turno, a alterar de certa maneira, no decurso do pensamento, o próprio conceito, sem que, nesse processo, sejam renunciadas as determinações que o conceito tinha originalmente. O que ocorre é, na verdade, que essa alteração se consuma justamente por meio da crítica ao conceito originário - isto é, mostrando-se que o conceito originário não está de acordo com sua própria coisa, não importa quão bem definida ela possa parecer. E essa alteração, com efeito, faz justiça ao próprio conceito originário, na medida em que o impele precisamente à concordância com a coisa. O abandono de uma definição qualquer pelo pensamento dialético não é um ato arbitrário, que seria realizado por meio de joguetes com definições variegadas, mas antes deve - em todo caso, ao menos segundo sua ideia- expressar justamente aquele momento da não identidade, da não coincidência entre conceito e coisa. E, por meio disso, o conceito, em sua constante confrontação com a coisa -portanto, em sua crítica imanente, como se pode também denominar-, tem-lhe imputada sua própria insuficiência. Desse modo, a modificação que o conceito experimenta nesse processo é, ao mesmo tempo - em todo caso, ao menos no sentido dado a isso pela filosofia hegeliana-, também uma modificação da coisa mesma.
— Introdução à dialética by Theodor W. Adorno (Page 80 - 81)