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Theodor W. Adorno: Introdução à dialética (Paperback, Português language, 2012, Unesp) No rating

Dialética é uma orientação na filosofia cujas motivações se entrelaçam com a própria origem do …

Creio ter mostrado com isso em que sentido o sistema deve ser entendido, na dialética, como um conceito crítico, isto é, no sentido de que, justamente o momento da unidade, que é designado por esse sistema e que nada negligencia, seja prontamente determinado como momento coercitivo, ao qual os seres humanos que nele vivem estão submetidos e do qual eles deveriam se libertar; por outro lado, porém, também no sentido de que esse momento de unidade, enquanto um [momento] dinâmico e que se desdobra em si mesmo, tem o potencial de avançar na direção de seu próprio colapso. Algo assim foi formulado pelo próprio Hegel, que percebeu tais coisas com assustadora sobriedade e clareza naquelas célebres passagens da Filosofia do direito nas quais diz que, necessariamente e a partir de seu próprio princípio, na sociedade civil-burguesa [bürgerliche Gesellschajt] com sua riqueza cresce, ao mesmo tempo, sua pobreza. Tal- vez me seja permitido até mesmo acrescentar ainda que o célebre papel apologético que Hegel conferiu ao Estado tem exatamente aqui seu lugar, isto é, que ele, com uma espécie de salto desesperado para fora da dialética - poderíamos dizer -, colocou o Estado como uma espécie de árbitro que de- veria trazer ordem àquilo que, na própria dialética, por meio da intensificação [Anwachsen] de oposições, não poderia senão se despedaçar. // Porém eu, ao dizer isso agora, tornando manifesta, a partir de Hegel, uma posição divergente da sua pró- pria, ou seja, ao sustentar que ele teria aqui empreendido uma espécie de construção violenta, a fim de salvar a positividade de seu sistema, sou obrigado a dizer que também nessa passagem, que à primeira vista parece um sacrifício dell'íntellecto, e a respeito da qual toda medíocre imbecilidade desde sempre se indignou, possui ao mesmo tempo, em seu interior, a mais profunda percepção [Einsicbt], a saber: a de que a sociedade civil-burguesa, tão logo queira se conservar em suas próprias condições como sociedade civil-burguesa, no momento de seu apogeu, vê-se forçada a produzir, a partir de si mesma, formas de tipo conservador e autoritário, as quais, de modo violento e sob a contínua recusa em se entregarem ao jogo imanente de forças, resultam em certa medida na contenção da dinâmica e na recondução da sociedade ao estágio da simples reprodução. Poderíamos dizer, portanto, caso se quisesse falar de maneira bastante arrojada, que a teoria do Estado em Hegel, e do con- sequente cumprimento do espírito absoluto no Estado, seria inteiramente correta, se tivesse sido apresentada por ele como uma teoria negativa, isto é, se tivesse se encaminhado para mostrar que, de fato, a sociedade civil-burguesa, em seu apogeu, na medida em que deseja permanecer como sociedade burguesa, terá necessariamente a tendência de desembocar no fascismo e no estado totalitário; e que uma sociedade civil-burguesa que permanecesse ad infinítum ligada de maneira imanente ao seu próprio sistema, não poderia mesmo sequer ser imaginada. No entanto, essa consequência grandiosa, que se encontra implícita na filosofia hegeliana do Estado, nunca foi extraída, sob ne-nhum aspecto, e isso devido a motivos apologéticos.

Introdução à dialética by  (Page 230 - 233)