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Theodor W. Adorno: Introdução à dialética (Paperback, Português language, 2012, Unesp) No rating

Dialética é uma orientação na filosofia cujas motivações se entrelaçam com a própria origem do …

A propósito, valeria a pena comentar aqui uma diferença da qual vocês terão já ouvido falar, mas que é raramente pensada de modo preciso e é em geral esquecida: a diferença entre materialismo dialético e materialismo vulgar, que podemos agora caracterizar de modo mais apropriado. E com isso vocês poderão talvez, daqui para a frente, entender o que quer dizer as- sumir uma posição contrária ao materialismo vulgar. Isso não significa que ao materialismo vulgar seria contraposto, digamos, um materialismo mais refinado, mas sim que na tentativa de explicar a partir das condições materiais todo e qualquer processo, formação espiritual ou o que quer que seja, não se pode pressupor, de modo imediato, que os assim chamados motivos materiais sejam os mais autênticos princípios explicativos. Em outras palavras, suponhamos uma teoria econômica vulgar que acreditasse poder deduzir a realidade econômica a partir do assim chamado impulso para o lucro ou da avidez por dinheiro, ou mesmo de outros motivos atinentes às intenções dos capitalistas, ou ainda a partir do chamado impulso 133 para o lucro, mas separado de motivações psicológicas. // Essa seria uma interpretação materialista vulgar, pois não recorre- ria à totalidade da sociedade, no interior da qual unicamente os impulsos [Strebungen] de empresários e trabalhadores adquirem primeiramente seu valor relativo. Ou seja, mesmo que supuséssemos que os capitalistas individuais fossem todos anjos - ou preferencialmente santos -, mas ao mesmo tempo coagidos, sob condições do capitalismo, a exercer suas atividades econômicas, então isso significaria que, apesar dessa intenção subjetiva, a despeito da completa ausência do chamado impulso para o lucro, nada de essencial se alteraria no decurso dos processos sociais como um todo. E eu creio, caso me seja permitido ainda acrescentar, que realmente muitas das malbaratadas investidas que hoje se apresentam na versão materialista de dialética estejam alojadas precisamente neste ponto: não se esforçam em dar uma explicação dos fenômenos sociais recorrendo à mediação pela totalidade; em vez disso, atribui- -se efetivamente ao adversário, isto é, à teoria materialista, a ingenuidade de querer explicar o mundo a partir de algo como o impulso para o lucro ou ainda, como elegantemente se diz, a partir de motivos materiais elementares. E então, depois que se tenha atribuído ao adversário essa tese sem sentido, fica fácil conseguir fazê-lo transitar à ideia de que haveria algo além dos tais motivos elementares - a saber, de que haveria também motivos mais elevados e nobres. Creio que, caso vocês desejem se ocupar com o problema da dialética materialista em geral, aquilo que se coloca primordialmente como imperativo é que tomem esse pensamento com toda seriedade, rejeitando assim todas essas representações - por exemplo, que o mundo deva ser explicado pelos assim chamados motivos elementares, ou seja, pelo impulso para o lucro, hipostasiado agora como a característica fundamental do ser humano. Devem, ao contrário, levar bem a sério o pensamento da totalidade social - portanto, do espírito objetivado do capitalismo - enquanto aquilo que poderia propriamente figurar como o princípio explicativo.

Introdução à dialética by  (Page 254 - 255)