"'- Então, com relação à fé - concluiu o chinês, seguidor de Confúcio -, é o orgulho que leva a equívocos e a discórdias entre os homens. Assim como o sol, assim também é Deus. Cada homem quer ter um Deus especial para si, ou pelo menos um Deus especial para a terra onde ele vive. Cada nação quer restringir a seus próprios templos um Deus que nem o mundo inteiro pode conter. Pode-se comparar um templo ao que o próprio Deus construiu para unir todos os homens em uma única fé e uma única religião? Todos os templos humanos são construidos à semelhança deste templo, que é o mundo de Deus. Cada templo tem sua fonte, sua abóbada no teto, suas lâmpadas, suas pinturas ou esculturas, suas inscrições, seu livro da lei, suas oferendas, seu altar e seus sacerdotes. Mas em qual templo existe uma fonte como o oceano, uma abóbada como a celeste, lâmpadas como o sol, a lua e as estrelas, imagens que se comparem a homens vivos, amorosos e prestimosos uns com os outros? Onde há registros da bondade de Deus que sejam tão fáceis de entender como as bênçãos que Ele distribuiu por toda parte para a felicidade dos homens? Onde está um livro de lei que seja tão claro para cada homem como aquele que está escrito no coração de cada um? Que sacrifícios se equiparam às abnegações que homens e mulheres amorosos fazem uns pelos outros? E que altar pode ser comparado ao coração de um homem bom, de quem o próprio Deus aceita o sacrifício? Quanto mais elevada a concepção que um homem tem de Deus, melhor ele O conhecerá. E, quanto mais ele conhecer a Deus, mais ele se aproximará Dele, imitando Sua bondade, Sua misericórdia e Seu amor pelos homens. Portanto, que aquele que vê a luz plena do sol iluminando o mundo se abstenha de culpar ou desprezar o homem supersticioso, que vê em seu ídolo um raio dessa mesma luz. Que não despreze nem mesmo o cético que é cego e não pode enxergar o sol.'
Assim falou o chinês, seguidor de Confúcio. E todos os que estavam presentes na cafeteria ficaram em silêncio e não mais discutiram sobre qual fé era a melhor."
— De quanta terra precisa um homem? e outras histórias by Liev Tolstói (Page 60 - 61)