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Vinciane Despret: O que diriam os animais? (Paperback, português language, 2021, Ubu) 5 stars

Os macacos sabem mesmo macaquear? Os animais podem se revoltar? Qual o interesse dos ratos …

"O que diriam os animais?" é sobre o que dizem os [animais] humanos

5 stars

Excelente livro da filósofa Vinciane Despret sobre a relação entre [animais] humanos e animais, sobre epistemologia da ciência e antropocentrismo. Com toques de sarcasmo e cutucando onde precisa ser cutucado, Despret é incisiva nas críticas a áreas pouquíssimo criativas como a sociobiologia. Por muito tempo, o tal do método científico vem tentado entender animais do ponto de vista antropocêntrico e Ocidental, como se estes fossem máquinas biológicas movidas pela passagem dos genes saudáveis, de acordo com a teoria da evolução. Isso despindo-os de agência, desejos, cognição, capacidade de buscar prazer, entre outros. E, na tentativa de denunciar os abusos praticados por esse método, muitos ativistas tratam os animais como se fossem vítimas, o que os despe dessas características, também. Despret aborda todos esses assuntos e faz o leitor questionar-se sobre as certezas da ciência (por exemplo, que lobos se organizam entre alfas, betas e ômegas... será?), sobre qual o limite entre o natural e o moralmente (in)correto, entre outros. Os principais autores em que Despret se alça são Isabelle Stengers, Donna Haraway, Bruno Latour, entre outros, como Michel Foucault.

O livro é organizado em capítulos por letras iniciais, como um abecedário, e pode ser lido sem nenhuma ordem específica, ainda que eu tenha lido de A a Z, nessa ordem. Meus capítulos preferidos foram "H de Hierarquia", "J de Justiça", "K de Kg", "N de Necessidade" e "Q de Queer". O meu menos preferido foi "G de Gênios". A apropriação da autora sobre certos conceitos de autismo não me agradou, e discordo da abordagem utilizada. Entretanto, esse tópico por si só mereceria um texto à parte.

Uma leitura importante para olhar a ciência com olhos filosóficos críticos, e questionar as certezas ocidentalizadas, ainda que dentro dos limites ocidentais (afinal de contas, Despret é uma mulher branca europeia). Coloco o livro com confiança na estante dos meus preferidos da vida. Gostaria de ler algum livro que filosofe sobre a percepção humana dos animais que fosse escrito por alguém do sul global, especialmente de povos originários, para entender se uma perspectiva diferente poderia suscitar questionamentos radicalmente diferentes. Ou seja, estou aceitando recomendações.