Back

reviewed Apoio Mútuo by Peter Kropotkin

Peter Kropotkin: Apoio Mútuo (Paperback, português language, Biblioteca Terra Livre) 4 stars

“As especulações darwinianas de Kropotkin sobre o possível papel da cooperação na evolução, com suas …

Clássico anarquista continua atual

4 stars

sol2070.in/2023/08/Cl%C3%A1ssico-anarquista-continua-atual

Li a versão em inglês, mas essa edição em português, da Biblioteca Terra Livre (de 2021), parece ótima.

Apoio Mútuo — Um fator de evolução (1902) é o grande clássico do russo Piotr Kropotkin, um dos mais importantes autores anarquistas. Entre os formuladores iniciais do movimento (como Proudhon e Bakunin), é o meu preferido.

Na verdade, o livro não é sobre o anarquismo em si, mas sobre o princípio natural que o embasa, segundo Kropotkin. O autor tinha formação como geógrafo e estudou e observou animais por muitos anos. Seus comentários e notas são consideradas valiosas até hoje nessa área de estudo.

Segundo o livro, apoio mútuo é um princípio mais fundamental do que a competição, observado nas mais variadas espécies animais, e não se restringe à cooperação entre indivíduos da mesma espécie, expandindo-se até para a ajuda recíproca entre tipos diferentes de animais. Isso não significa que não haja competição, mas no final as espécies que mais se engajam em apoio mútuo são as mais bem-sucedidas, como o próprio Darwin também notou (apesar da deturpação do "darwinismo social", que afirma o contrário).

Kropotkin exemplifica e analisa esse comportamento em animais (incluindo insetos) e em diferentes tipos de agrupamentos humanos, conforme a evolução social, até o século 19. Por exemplo, é detalhado o modo como pássaros coordenam e dividem a caça (às vezes até entre espécies diferentes) ou como os antigos grêmios ("guilds") de profissões — como ferreiros ou tripulações de navios — tinham seu próprio código legal, de modo descentralizado, auto-organizado e com amplo apoio mútuo.

Assim, a auto-organização, descentralização, solidariedade recíproca e ausência de hierarquias que são amplamente observadas na natureza (incluindo humanos) fundamentam e justificam as sociedades anarquistas como sendo o tipo de organização mais harmônica e em linha com nossa natureza.

Um trecho do livro:

"Não é o amor, e nem mesmo a simpatia (entendida em seu sentido adequado) que induz um rebanho de ruminantes ou de cavalos a formar um anel para resistir a um ataque de lobos; não é o amor que induz os lobos a formar uma matilha para caçar; não é o amor que induz gatinhos ou cordeiros a brincar, ou uma dúzia de espécies de pássaros jovens a passar seus dias juntos no outono; e não é o amor nem a simpatia pessoal que induz muitos milhares de gamos espalhados por um território tão grande quanto a França a formar dezenas de rebanhos separados, todos marchando em direção a um determinado local para atravessar um rio. É um sentimento infinitamente mais amplo do que o amor ou a simpatia pessoal — um instinto que foi desenvolvido lentamente entre os animais e os homens no curso de uma evolução extremamente longa e que ensinou tanto aos animais quanto aos homens a força que podem emprestar da prática da ajuda e do apoio mútuos e as alegrias que podem encontrar na vida social ... . Não é no amor e nem mesmo na simpatia que a sociedade humana se baseia. É a consciência — mesmo que esteja apenas no estágio de um instinto — da solidariedade humana. É o reconhecimento inconsciente da força que cada humano toma emprestada da prática da ajuda mútua; da estreita dependência da felicidade de cada um em relação à felicidade de todos; e do senso de justiça ou equidade que leva o indivíduo a considerar os direitos de todos os outros indivíduos como iguais aos seus. Sobre esse fundamento amplo e necessário, desenvolvem-se os sentimentos morais ainda mais elevados."