Back

reviewed A Travessia by Cormac McCarthy (Trilogia da Fronteira, #2)

Cormac McCarthy: A Travessia (Paperback, português language, Companhia das Letras) 5 stars

Depois de Todos os belos cavalos, Cormac McCarthy continua sua Trilogia da Fronteira, apresentando agora …

Contornos míticos da realidade

5 stars

(resenha publicada em sol2070.in/2024/08/livro-a-travessia-cormac-mccarthy/ )

"A Travessia" (1994) é o segundo volume da Trilogia da Fronteira, do estadunidense Cormac McCarthy. É um dos autores que mais admiro e esse foi não só seu melhor livro que já li, como entra fácil na lista de melhores de todos os tempos.

McCarthy se consagrou com suas grandes histórias atemporais, que poderiam se passar em qualquer lugar em qualquer tempo, realçando os contornos míticos da realidade. Sabe aqueles filmes em que cada quadro é uma pintura? Ele faz o equivalente na literatura.

Os elementos principais de A Travessia são estrada, amadurecimento, violência, natureza e ruína humana. Se passa na fronteira entre EUA e México, nos anos 40. Uma loba fora do lugar — a espécie estava extinta na região — perturba os arredores de uma fazenda de gado, e um adolescente é encarregado de caçá-la. Esse é o fator que desencadeia uma série de andanças pelas ruínas da Revolução Mexicana e a conflagração completa de sua vida. É aquela história humana primordial: um problema bate na porta e ao sair para tentar resolver a situação, aprende-se um tanto enorme sobre o que é o mundo.

O talento único de McCarthy que o distinguiu como um dos maiores autores norte-americanos do século 20 é esculpir narrativas, desde o nível de frases e (ausência de) vírgulas, que evocam a dimensão lendária da existência humana.

Ao mesmo tempo que é literatura no estado da arte, envolve completamente, quase como um vira-páginas.

A transmissão é feita nas entrelinhas das frases lapidares. Por exemplo, a loba. O rapaz sente um temor fascinado por tudo o que ela encarna. É um portal encantado como a baleia de Moby Dick. Isso está na coração do protagonista, é como ele enxerga o mundo, um anseio ancestral. Em nenhum momento ele diz nada a respeito, mas não há dúvida sobre isso.

Havia lido o primeiro volume da trilogia, "Todos os Belos Cavalos" (1992), há 25 anos. Era muito diferente do que costumava ler — ficção científica e beatniks — e, apesar de ter sentido o poder da história, devo ter capturado só uns 30% da beleza. Vou reler. São livros para a vida toda.