Este artigo revela uma parte considerável do enredo da obra.
John William Polidori nasceu em Londres a 7 de Setembro de 1795, filho do escritor e tradutor Gaetano Polidori (responsável pela tradução de Paradise Lost e The Castle of Otranto para italiano) e de Anna Maria Pierce. Em 1804 inicia a sua educação no Ampleforth College em Yorkshire, e em 1811 ingressa na Universidade de Edinburgo, conseguindo o seu doutoramento em medicina com apenas 19 anos.
Em 1816, através de uma recomendação de Sir William Knighton, Lord Byron contrata Polidori para o acompanhar nas suas viagens pela Europa como seu médico pessoal. Durante o Verão do mesmo ano instalam-se na Suiça, onde Byron é frequentemente visitado por Jane Clairmont, Percy Bysshe Shelley e Mary Wollstonecraft Godwin, todos eles presentes na famosa competição realizada numa noite de Junho em que, após uma sessão de leitura de histórias de fantasmas, Byron desafiou …
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Ricardo Lourenço reviewed The vampyre, and other tales of the macabre by John William Polidori (Oxford world's classics)
Review of 'The vampyre, and other tales of the macabre' on 'Goodreads'
4 stars
Este artigo revela uma parte considerável do enredo da obra.
John William Polidori nasceu em Londres a 7 de Setembro de 1795, filho do escritor e tradutor Gaetano Polidori (responsável pela tradução de Paradise Lost e The Castle of Otranto para italiano) e de Anna Maria Pierce. Em 1804 inicia a sua educação no Ampleforth College em Yorkshire, e em 1811 ingressa na Universidade de Edinburgo, conseguindo o seu doutoramento em medicina com apenas 19 anos.
Em 1816, através de uma recomendação de Sir William Knighton, Lord Byron contrata Polidori para o acompanhar nas suas viagens pela Europa como seu médico pessoal. Durante o Verão do mesmo ano instalam-se na Suiça, onde Byron é frequentemente visitado por Jane Clairmont, Percy Bysshe Shelley e Mary Wollstonecraft Godwin, todos eles presentes na famosa competição realizada numa noite de Junho em que, após uma sessão de leitura de histórias de fantasmas, Byron desafiou cada um a escrever uma história dentro do género. A competição inspirou Mary Godwin, que começou a escrever uma das mais influentes obras da literatura gótica: Frankenstein; Byron cedo perdeu o interesse, limitando-se a escrever parcialmente um conto intitulado Augustus Darvell; Polidori dedicou-se a Ernestus Berchtold; or, The Modern Oedipus - o único romance que viria a publicar - e, posteriormente, desenvolveu o conceito presente no fragmento de Byron, dando origem a The Vampyre.
Em 1819, Henry Colburn, procurando tirar partido da fama do poeta Inglês, publica The Vampyre na New Monthly Magazine com o subtítulo "A Tale by Lord Byron". Pouco tempo após a publicação, Polidori reclama a autoria da obra, muito embora reconheça a importância que Byron teve na sua constituição. A forma como o manuscrito chegou aos escritórios da New Monthly permanece um mistério, mas é facto que The Vampyre se tornou rapidamente num grande sucesso.
"It happened that in the midst of the dissipations attendant upon London winter, there appeared at the various parties of the leaders of the ton a nobleman more remarkable for his singularities, than his rank. He gazed upon the mirth around him, as if he could not participate therein. Apparently, the light laughter of the fair only attracted his attention, that he might by a look quell it and throw fear into those breasts where thoughtlessness reigned. Those who felt this sensation of awe, could not explain whence it arose: some attributed it to the dead grey eye, which, fixing upon the object's face, did not seem to penetrate, and at one glance to pierce through to the inward workings of the heart; but fell upon the cheek with a leaden ray that weighed upon the skin it could not pass."
The Vampyre destaca-se, essencialmente, por transportar o vampiro para o ambiente urbano. Até à data, tanto no folclore como na literatura, o vampiro era uma figura repugnante, subsistindo à base do instinto de modo a satisfazer a sua necessidade por sangue. Em contraste, a criação de Polidori – Lord Ruthven –, é uma personagem sofisticada e atraente, que se desloca pela alta sociedade inglesa sem levantar quaisquer suspeitas enquanto escolhe as suas vítimas. É esta ameaça latente, esta diluição da fronteira entre o natural e o sobrenatural, que torna Ruthven numa figura aterrorizadora de uma forma que os seus antecessores nunca conseguiram atingir.
O conto inicia-se apresentando o jovem e inexperiente Aubrey, que acredita que "os sonhos dos poetas são as realidades da vida," mas que cedo percebe, apesar da sua ingenuidade, que a vida social se distancia bastante do que se pode ler nos romances. Quebrada a ilusão, Aubrey fica intrigado com o misterioso mas fascinante Ruthven, e decide aproximar-se deste com a intenção de estudar a sua estranha personalidade. Eventualmente organizam uma viagem em conjunto, e é durante essa viagem que Aubrey detecta alguns sinais alarmantes no que toca à conduta do seu companheiro.
"His companion was profuse in his liberality; -- the idle, the vagabond, and the beggar, received from his hand more than enough to relieve their immediate wants. But Aubrey could not avoid remarking, that it was not upon the virtuous, reduced to indigence by the misfortunes attendant even upon virtue, that he bestowed his alms; -- these were sent from the door with hardly suppressed sneers; but when the profligate came to ask something, not to relieve his wants, but to allow him to wallow in his lust, to sink him still deeper in his iniquity, he was sent away with rich charity. This was, however, attributed by him to the greater importunity of the vicious, which generally prevails over the retiring bashfulness of the virtuous indigent. There was one circumstance about the charity of his Lordship, which was still more impressed upon his mind: all those upon whom it was bestowed, inevitably found that there was a curse upon it, for they were all either led to the scaffold, or sunk to the lowest and the most abject misery."
Estas situações inquietam Aubrey, mas só quando recebe uma carta dos seus pais a alertar para a comportamento imoral e para a capacidade de sedução de Ruthven, é que decide abrir mão da sua amizade, decidido a não viajar com alguém “cujo carácter não tinha mostrado um único ponto brilhante.”
Após esta quebra de relações, prossegue sozinho para a Grécia, onde durante algum tempo explora as ruínas de Atenas e se apega à bela Ianthe, filha dos donos da casa onde tomou residência. Ironicamente, Ianthe tenta convencer o céptico Aubrey da existência de vampiros, acabando por perecer nas mãos de um. Perturbado pelo sucedido, Aubrey adoece e, para sua surpresa, ao acordar do seu sono febril encontra Ruthven a cuidar de si.
"His lordship seemed quite changed; he no longer appeared that apathetic being who had so astonished Aubrey; but as soon as his convalescence began to be rapid, he again gradually retired into the same state of mind, and Aubrey perceived no difference from the former man, except that at times he was surprised to meet his gaze fixed intently upon him, with a smile of malicious exultation playing upon his lips: he knew not why, but this smile haunted him."
O inesperado acto leva a uma reconciliação, e os dois companheiros retomam a sua viagem durante a qual se tornam vítimas de uma emboscada. Durante o ataque Ruthven é ferido e acaba, aparentemente, por morrer, embora não sem antes obrigar Aubrey a jurar que ocultaria qualquer pormenor acerca dos seus crimes durante um ano e um dia. Decidido a não permanecer num país que só lhe trouxe infortúnios, e após descobrir que o amigo fora o responsável pela morte da encantadora Ianthe, Aubrey regressa a Inglaterra.
Gradualmente consegue abtrair-se do seu passado recente até uma noite em que, para seu choque, reencontra Ruthven. Tal acontecimento coloca-o num estado de histeria tal que a família se vê obrigada a confiná-lo ao seu quarto, com supervisão de um médico. O seu estado acaba por piorar ao se aperceber que a sua irmã está noiva de Ruthven, estando o casamento previsto exactamente para último dia do seu juramento. Incapaz de evitar que a sua irmã se torne em mais uma das vítimas do dissimulado vampiro, o seu desespero resulta no rompimento de um vaso sanguíneo, dando-lhe apenas tempo para relatar a sua história, revelando, finalmente, a verdadeira natureza de Lord Ruthven.
"He shut his eyes, hoping that it was but a vision arising from his disturbed imagination; but he again saw the same form, when he unclosed them, stretched by his side. There was no colour upon her cheek, not even upon her lip; yet there was a stillness about her face that seemed almost as attaching as the life that once dwelt there: -- upon her neck and breast was blood, and upon her throat were the marks of teeth having opened the vein: -- to this the men pointed, crying, simultaneously struck with horror, «A Vampyre! a Vampyre!»"
The Vampyre é importante não só por trazer o vampiro para a esfera aristocrática, mas também por ilustrar um período de transição na literatura gótica, em que os medos, que antes ganhavam forma nos oprimentes castelos ou mosteiros, passaram a ser incorporados por monstros. De facto, o persuasivo Ruthven encarna o receio que a nobreza tinha por homens elegantes e sem escrúpulos, capazes de atrair e desonrar as suas filhas, arruinando-as a nível moral e social. É também aterrorizador no sentido em que consegue subverter as normas sexuais, usando isso a seu favor para exercer um forte domínio tanto sobre as mulheres como sobre os homens.
Por outro lado, Polidori não adopta a típica estrutura utilizada na grande maioria dos romances góticos produzidos até à data, algo especialmente evidente no casamento que se realiza no final do conto, casamento esse que, ao invés de representar uma fase de libertação do mal que assombrou a história, representa, isso sim, a libertação e o triunfo desse próprio mal.
Independentemente da influência de Byron, que levou muitos a acusar Polidori de plágio, a verdade é que este último transformou um fragmento inacabado numa história coesa, estabelecendo um modelo que viria desenvolvido por James Rymer em Varney the Vampire, por Sheridan Le Fanu em Carmilla e, acima de tudo, por Bram Stoker em Dracula. É, pois, imerecidamente que este autor permanece na sombra, quando a sua contribuição, embora curta, se ramificou até aos nossos dias.
Referências:
Birkhead, Edith. The Tale of Terror . Project Gutenberg, 2004. www.gutenberg.org/ebooks/14154
Bomarito, Jessica. Gothic Literature: A Gale Critical Companion. Detroit: Thomson/Gale, 2006.
Botting, Fred. Gothic. Londres: Routledge, 1996.
Heiland, Donna. Gothic and Gender: An Introduction, Oxford: Blackwell Publishing, 2004.
Polidori, John William. The Vampyre and Other Tales of the Macabre. Nova Iorque: Oxford University Press, 2008.
Nigel Leask, Polidori, John William (1795–1821), Oxford Dictionary of National Biography, Oxford University Press, 2004, www.oxforddnb.com/view/article/22466
Punter, David; Byron, Glennis. The Gothic. Oxford: Blackwell Publishing, 2004.
Ricardo Lourenço rated The Elements of Style: 5 stars
The Elements of Style by William Strunk
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Ricardo Lourenço reviewed The monk by Matthew Gregory Lewis (Oxford World's classics)
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4 stars
Matthew Gregory Lewis nasceu em Londres, a 9 de Julho de 1775. Os seus pais separam-se quando tinha apenas 6 anos, acontecimento que marcou indelevelmente a sua vida; o talento para a escrita e a vontade em auxiliar financeiramente a sua mãe leva Lewis a traduzir poesia, peças de teatro e a escrever os seus próprios textos enquanto que o desejo de agradar o pai, que ambicionava uma carreira diplomática para o filho, induz o jovem autor a concluir os seus estudos em Oxford e a viajar pela Europa.
Em 1791, numa carta para a sua mãe, revela que se encontra a trabalhar num romance “ao estilo de O Castelo de Otranto”. Acaba, no entanto, por desistir da obra até 1794, ano em que a publicação de Os Mistérios de Udolpho de Ann Radcliffe, que Lewis considerou como “um dos mais interessantes livros jamais publicados”, o incentivou a prosseguir a …
Matthew Gregory Lewis nasceu em Londres, a 9 de Julho de 1775. Os seus pais separam-se quando tinha apenas 6 anos, acontecimento que marcou indelevelmente a sua vida; o talento para a escrita e a vontade em auxiliar financeiramente a sua mãe leva Lewis a traduzir poesia, peças de teatro e a escrever os seus próprios textos enquanto que o desejo de agradar o pai, que ambicionava uma carreira diplomática para o filho, induz o jovem autor a concluir os seus estudos em Oxford e a viajar pela Europa.
Em 1791, numa carta para a sua mãe, revela que se encontra a trabalhar num romance “ao estilo de O Castelo de Otranto”. Acaba, no entanto, por desistir da obra até 1794, ano em que a publicação de Os Mistérios de Udolpho de Ann Radcliffe, que Lewis considerou como “um dos mais interessantes livros jamais publicados”, o incentivou a prosseguir a sua escrita. Incapaz de terminar a história que tinha desenvolvido, e de modo a combater o aborrecimento inerente ao cargo que passou a ocupar na embaixada britânica na Holanda, Lewis resolve principiar um novo romance; em cerca de dez semanas escreve O Monge, terminando assim a obra que o iria tornar famoso com apenas 19 anos.
Após regressar a Londres, Lewis encontra sem grandes dificuldades um editor para o seu romance, sendo a primeira edição de O Monge publicada em Março de 1796.
“(...) The Monk is a romance, which if a parent saw in the hands of a son or daughter, he might reasonably turn pale.”
(Coleridge, 1797)
O anticatolicismo característico do romance gótico, manifesta-se também em O Monge, algo que, aliado à violência explícita nele descrita, causou uma enorme polémica, especialmente entre os críticos mais conservadores que catalogaram a obra como imoral e acusaram o autor de blasfémia. Tais acusações acabariam por resultar num processo em tribunal, o que obrigou Lewis a reeditar o seu trabalho, censurando algumas passagens. Apesar disso, nenhum crítico negou o génio de Lewis, e a recepção do público foi favorável, tendo sido publicadas cinco edições de O Monge até ao final do séc. XVIII.
“He is now thirty years old, every hour of which period has been passed in study, total seclusion from the world, and mortification of the flesh. Till these last three weeks, when He was chosen superior of the Society to which He belongs, He had never been on the outside of the Abbey-walls: Even now He never quits them except on Thursdays, when He delivers a discourse in this Cathedral which all Madrid assembles to hear. His knowledge is said to be the most profound, his eloquence the most persuasive. In the whole course of his life He has never been known to transgress a single rule of his order; The smallest stain is not to be discovered upon his character; and He is reported to be so strict an observer of Chastity, that He knows not in what consists the difference of Man and Woman. The common People therefore esteem him to be a Saint.”
O enredo de O Monge divide-se em duas histórias que se vão alternando e cujos pontos de contacto se tornam evidentes à medida que nos aproximamos da sua conclusão. A história principal diz respeito ao monge Ambrosio, apresentado como um exemplo de virtude, figura admirada pela sua conduta irrepreensível e pelo seu conhecimento. Isolado da sociedade e dos seus vícios, Ambrosio coloca uma excessiva confiança na sua virtude, iludindo-se ao ponto de acreditar que as paixões que dominam o ser humano não têm qualquer poder sobre si. Cedo se torna evidente que foi o seu isolamento que permitiu ao monge reprimir essas paixões. Quando o seu estimado noviço revela ser, na verdade, uma mulher de nome Matilda, levada pelo seu amor ao monge a disfarçar-se de modo a poder permanecer a seu lado, Ambrosio é exposto pela primeira vez à tentação.
“’Either your hand guides me to Paradise, or my own dooms me to perdition! Speak to me, Ambrosio! Tell me that you will conceal my story, that I shall remain your Friend and your Companion, or this poignard drinks my blood!’
As She uttered these last words, She lifted her arm, and made a motion as if to stab herself. The Friar’s eyes followed with dread the course of the dagger. She had torn open her habit, and her bosom was half exposed. The weapon’s point rested upon her left breast: And Oh! That was such a breast! The Moon-beams darting full upon it, enabled the Monk to observe its dazzling whiteness. His eye dwelt with insatiable avidity upon the beauteous Orb. A sensation till then unknown filled his heart with a mixture of anxiety and delight: A raging fire shot through every limb; The blood boiled in his veins, and a thousand wild wishes bewildered his imagination.
‘Hold!’ He cried in a hurried faultering voice; ‘I can resist no longer! Stay, then, Enchantress; Stay for my destruction!’”
Seduzido por Matilda, Ambrosio quebra os seus votos e desperta assim o apetite sexual que será responsável pela sua ruína moral, algo que o seu orgulho não lhe permite admitir. A sua queda torna-se inevitável devido à natureza dos seus desejos; apenas a pureza incita o seu apetite, só a beleza e a virgindade são capazes de o saciar. Satisfeito esse apetite, o seu objecto perde o encanto. É o que acontece com Matilda: desprovida da virgindade que a tornava tão atractiva aos olhos do monge, torna-se num espelho dos seus pecados, desvanecendo-se todo o seu interesse por ela. Assim, os desejos do monge direccionam-se para Antonia. Matilda, que demonstra ter conhecimentos de magia negra, convence o relutante Ambrosio a aceitar a sua ajuda sobrenatural, conseguindo graças a isso infiltrar-se na casa de Antonia. Apesar disso os seus planos não correm como esperado, e acaba por assassinar Elvira, mãe de Antonia. Recorrendo de novo ao auxílio de Matilda, consegue forjar a morte de Antonia e deslocá-la para uma cripta onde finalmente concretiza os seus intentos, violando a jovem rapariga.
“For a time spare diet, frequent watching, and severe penance cooled and represt the natural warmth of his constitution: But no sooner did opportunity present itself, no sooner did He catch a glimpse of joys to which He was still a Stranger, than Religion’s barriers were to feeble to resist the over-whelming torrent of his desires. All impediments yielded before the force of his temperament, warm, sanguine, and voluptuous in the excess. As yet his other passions lay dormant; But they only needed to be once awakened, to display themselves with violence as great and irresistible.”
Para além da corrupção dos valores morais de Ambrósio, acompanhamos a história de amor de Raymond e Agnes. Contra a sua vontade, Agnes está destinada a viver num convento, e as suas tentativas para escapar aos desígnios familiares revelam-se infrutíferas, apesar do auxílio de Raymond. Este reencontra-a em Madrid e, sob disfarce, consegue infiltrar-se no convento, onde, num dos seus encontros, o casal cede à tentação e Agnes engravida. Tal situação torna-se do conhecimento da abadessa, que decide punir impiedosamente Agnes, encenando a sua morte e aprisionando-a. Lorenzo, irmão de Agnes, desconhecendo a situação da sua irmã, tenta prender a abadessa durante uma procissão, acusando-a de assassinato. A multidão revolta-se perante tamanha crueldade, o que resulta na morte da abadessa e de várias freiras inocentes, assim como na destruição do convento. Durante o caos, Lorenzo descobre não só a sua irmã, mas também a sua amada Antonia, à beira da morte após ter sido apunhalada por Ambrosio. O monge é capturado e interrogado pela inquisição; desesperado, vende a sua alma ao diabo em troca da sua liberdade. Tal sacrifício garante-lhe apenas a revelação de que Elvira era sua mãe e Antonia sua irmã, para além de uma horrível morte.
“Universal silence prevailed through the Crowd, and every heart was filled with reverence for religion. Every heart but Lorenzo’s. Conscious that among those who chaunted the praises of their God so sweetly, there were some who cloaked with devotion the foulest sins, their hymns inspired him with detestation at their Hypocrisy.”
A importância de O Monge no panorama literário deve-se, sobretudo, à quebra de convenções que Lewis efectua no romance. Numa época em que o gótico era dominado pela suavizadora sensibilidade feminina, de que Ann Radcliffe é exemplo, Lewis não se deixa coibir pelas restrições que limitavam os seus precursores, recusando-se a atenuar a violência e a crueldade que as paixões humanas são capazes de desencadear. As típicas heroínas, devotas e virginais, podem ser encontradas em O Monge, mas, ao invés de escaparem das garras do vilão, perecem nas mãos deste. A intervenção divina que se manifesta em favor dos virtuosos, é substituída pela influência demoníaca que incita à corrupção. No fundo, Lewis adopta as convenções do género até determinado ponto, a partir do qual as inverte. Tal inversão, conjugada com as fortes descrições dos crimes perpetrados por Ambrosio, não poderia deixar de chocar os leitores da época.
O talento de Lewis como dramaturgo transparece também em O Monge, tanto pelas cenas curtas e dramáticas, muitas vezes associadas a sonhos ou circunstâncias sobrenaturais, desafiando constantemente as crenças do leitor, chocando-o com a exposição das falhas a que qualquer ser humano é susceptível. Também a nível de diálogo é evidente esta influência, levando por vezes a uma linguagem excessivamente teatral, adequada para um actor a representar num palco perante uma plateia, mas pouco verosímil quando aplicada a um romance. De resto, o autor opta quase sempre pelo espectáculo em detrimento da coerência do romance; a crítica à superstição é disso exemplo: por um lado, várias personagens consideram a superstição como o produto de uma mente fraca, enquanto que por outro, o sobrenatural se manifesta sem que exista uma explicação racional para o desmistificar, pelo que a referida crítica não só carece de suporte, como é contrariada pelos acontecimentos.
Independentemente dos seus exageros, compreensíveis tomando em conta a idade que o autor tinha quando finalizou o romance, O Monge é um inquietante retrato dos excessos que o ser humano comete quando dominado pelas suas paixões, e de como esses excessos muitas vezes são encobertos por uma enganadora aparência de virtude. Um importante marco da literatura gótica que influenciou significativamente a produção literária dentro do género.
Edições:
The Monk encontra-se disponível integralmente no Project Gutenberg. A nível de versões impressas, tanto a edição da Oxford University Press como a edição da Penguin proporcionam uma interessante introdução, assim como notas explicativas. O romance encontra-se também traduzido para português, sendo as versões mais recentes editadas pela Bonecos Rebeldes e pela Modo de Ler Editores e Livreiros.
Referências:
Birkhead, Edith. The Tale of Terror . Project Gutenberg, 2004. www.gutenberg.org/ebooks/14154
Bomarito, Jessica. Gothic Literature: A Gale Critical Companion. Detroit: Thomson/Gale, 2006.
Botting, Fred. Gothic. Londres: Routledge, 1996.
Coleridge, Samuel Taylor. “A review of The Monk.”The Critical Review 19. 1797.
Lewis, Matthew. The Monk. Nova Iorque: Oxford University Press, 2008.
Punter, David; Byron, Glennis. The Gothic. Oxford: Blackwell Publishing, 2004.
Smith, Andrew. Gothic Literature. Edinburgh: Edinburgh University Press, 2007.
Sousa, Maria Leonor Machado. A Literatura “Negra” ou de Terror em Portugal (séculos XVIII e XIX). Lisboa: Editorial Novaera, 1978.
Summers, Montague. “Matthew Gregory Lewis.” The Gothic Quest. Nova Iorque: Russell & Russell, 1964.
Wright, Angela. “European Disruptions of the Idealized Woman: Matthew Lewis’s The Monk and the Marquis de Sade’s La Nouvelle Justine.” European Gothic: A Spirited Exchange, 1760-1960. Manchester: Manchester University Press, 2002.