Reviews and Comments

Marte

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finished reading Abandonment Neurosis by Germaine Guex (The History of Psychoanalysis)

Germaine Guex, Peter D. Douglas: Abandonment Neurosis (2015, Taylor & Francis Group) No rating

First published in 1950, La nevrose d'abandon was and still is a ground-breaking work. The …

Li 3 de 4 capítulos, mas não considero desistência porque li o que me interessava (o capítulo 4 é sobre táticas terapêuticas e não entendo de psicanálise o suficiente para apreciar).

Paul B. Preciado: Um apartamento em Urano (Paperback, Português language, 2019, Zahar) 4 stars

Com uma radicalidade lúcida e furiosa que demole qualquer noção conservadora e normativa, Um apartamento …

Crônicas do devir

4 stars

Se eu tivesse um real para cada vez que Paul B. Preciado fala do devir deleuziano, eu estaria com dinheiro para comprar um açaí.

Piadas à parte, eu comecei esse livro bastante empolgada. Os primeiros capítulos são chocantes, no bom sentido. Preciado detona a família margarina e a supremacia branca-ocidental mais de uma vez. Conforme o livro foi passando, pela quantidade de temas a que somos expostos, aprendemos um pouco mais das subjetividades (e ele adora essa palavra, tá) do autor. Alguns, me deram um pouco de sono. Explico.

Peguei esse livro, que foi um presente meu para meu marido, para ler porque estava interessada nessa tal de travessia do sistema sexo-gênero. Questões pessoais à parte, fui surpreendida, porque não necessariamente os ensaios aqui aglomerados fazem referência a isso - mas o assunto não deixa de aparecer durante o livro todo. O livro é composto por 72 ensaios escritos de …

Sam Kean: A colher que desaparece (Paperback, português language, 2011, Zahar) 4 stars

Uma colher que desaparece quando colocada no chá quente, uma bizarra corrida pelo ouro causada …

Um livro com altos e baixos (alguns bem baixos)

4 stars

A premissa toda do livro A Colher que Desaparece é ser um livro de curiosidades sobre a história da ciência. Eu adoro história da ciência e eu adoro curiosidades. O problema é quando o autor pega muito nas curiosidades e esquece do rigor da história da ciência. Para mim, de forma resumida, o maior defeito desse livro é ser americano. Algumas coisas que o autor vê como óbvias ou que são simplesmente ignorância da parte dele são extremamente estadunidenses. Por exemplo, na esteira de Karl Popper (o filósofo da ciência preferido de 10 em 10 cientistas das exatas, porque eles não gostam de filosofia, só de fingir que gostam de filosofia), classifica o marxismo como uma pseudociência. Ou então mais de uma vez cita Stálin para provar um ponto que poderia ter sido provado com figuras estadunidenses, porque o americano ama um espantalho soviético para chamar de seu, mesmo no …

Julián Fuks: A Resistência (Paperback, português language, 2015, Companhia das Letras) 4 stars

“Meu irmão é adotado, mas não posso e não quero dizer que meu irmão é …

Argentino demais para ser brasileiro, brasileiro demais para ser argentino

4 stars

Esse livro é uma peça de ficção muito autobiográfica de Julián Fuks, um autor brasileiro filho de pais exilados da Argentina durante uma ditadura militar (1976-1983). Digo que é uma ficção muito autobiográfica porque muitas coisas que aparecem no livro no tocante ao protagonista são praticamente idênticas aos dados públicos de Fuks, incluindo o fato de ser filho de exilados políticos argentinos. Onde termina a realidade e começa a ficção e vice-versa é algo que o autor nunca deixou claro, e parte da graça do livro.

É um livro relativamente curto, que traz bastante coisa da psicanálise Winnicottiana, e relaciona as pontes entre traumas relacionados à ditadura e traumas familiares associados ao exílio e à adoção de crianças. Em alguns momentos, eu me irritei com o tom pesaroso que o protagonista assume para si mesmo frente ao seus dilemas com o irmão adotivo, mas da metade para o final o …

Tatiana Roque: O dia em que voltamos de Marte (Paperback, Português language, Crítica) 4 stars

Durante séculos, a ciência e a política se uniram por projetos de mundo, passando a …

"Pare o mundo que eu quero descer", mas é de Marte que estamos descendo

4 stars

A capa do livro da Tatiana Roque tem algo que, eu não sei se foi proposital, mas se aproxima muito da representação visual da reação de Belousov-Zhabotinsky. Essa reação acontece fora da termodinâmica do equilíbrio, intimamente ligada à teoria do caos. E é exatamente sobre reações complexas encadeadas que não podem ser descritas por equações diferenciais que Tatiana Roque, matemática e historiadora da matemática, aborda em seu livro.

O livro de Roque tem alguns pontos principais, mas coloco luz sobre um dos mais interessantes para mim: como a ciência do clima, incluindo a comunicação sobre fenômenos do aquecimento global, pouco tem a ver com o modelo de ciência anterior, fortemente relacionado às certezas quase-exatas das equações diferenciais da astronomia. Saímos, durante o século XX, do modelo de ciência com certeza para a ciência que trabalha com aproximações estatísticas - nem por isso menos confiáveis. No meio de tudo isso, uma …

reviewed A importância de ser prudente by Oscar Wilde (L&PM Pocket, #1139)

Oscar Wilde: A importância de ser prudente (Paperback, português language, 2014, L&PM) 4 stars

Uma das comédias mais populares de todos os tempos

Poucos nomes da literatura rivalizam com …

Oh to read a Trivial Comedy for Serious People

4 stars

Ganhei esse livro de uma mulher gaúcha que morou comigo em São Paulo em 2015. Dividíamos o quarto da pensão, e ela era pelo menos 25 anos mais velha do que eu. Ela meio que me adotou como filha postiça dela na época, já que seus filhos mesmo tinham ficado temporariamente no RS. Além disso, ela trabalhava na Livraria Cultura, então estava sempre com livros. Quando deixei a pensão, ela me deu esse livro e deixou uma dedicatória muito fofa, dedicada "à quiçá futura professora de químca". Olha só, eu realmente me formei professora de química. Saudades dela, gostaria de saber como está, mas nunca mais tive contato. Sou ruim com essas coisas.

Bom, voltando para o livro, A importância de ser prudente é uma peça de teatro bastante afiada, dedicada a tirar sarro da burguesia britânica do final do século XIX. Nisso, Oscar Wilde é excelente. Tenho vontade de …

Peter Norton: Autonorama (Paperback, português language, 2023, Autonomia Literária) 4 stars

“As bases foram lançadas para a autonomia total”, anunciou Elon Musk em 2016, quando garantiu …

Ilusões tecnológicas e outras trapaças da indústria automotiva, mas não só dela, do capitalismo

4 stars

Autonorama é um livro feito para quem tem raiva da carrocracia, mas sem advogar pelo fim completo dos carros. Mais especificamente, Peter Norton revive a saga histórica dos Futuramas I e II, ligados à montadora automobilística General Motors nos EUA, e estende a nomenclatura "Futurama" a fenômenos das décadas de 1990 e 2010 como Futurama III e Futurama IV (Autonorama). Longe de ser uma questão somente da General Motors, o automóvel individual é um problema de urbanismo e saúde pública nos EUA. Nem a pior cidade em termos de carros no Brasil, São Paulo, consegue fazer entender o que é a dependência completa de carro no país inteiro. Norton estabelece quais foram as artimanhas legais articuladas pelos capitalistas automobilistas para que a situação chegasse a esse ponto. O marketing é o cerne do caos capitalista, não a pulsão de avanço. Aqui, o autor dá responsabilidade a todos os que devem …

Drauzio Varella: Estação Carandiru (Paperback, português language, 1999, Companhia das Letras) 5 stars

Com mais de 7200 presos, a Casa de Detenção de São Paulo é o maior …

Sociologia em seu estado mais cru

5 stars

Poucos médicos que eu conheço merecem alguma menção especial em relação ao seu trabalho ou sua atuação política. Drauzio Varella certamente é um deles. Drauzio escreveu alguns livros sobre sua atuação em presídios, especialmente no Carandiru [Casa de Detenção de São Paulo], um presídio na cidade de São Paulo desativado em 2002. Estação Carandiru, claro, é um desses livros.

Comprei esse livro numa visita aleatória a um sebo e foi uma ótima aquisição. Estação Carandiru foi lançado em 1999, antes mesmo do fechamento da Casa de Detenção, e tem as marcas temporais (não somente físicas, no caso da minha impressão de 2000) de 25 anos atrás. Por exemplo, ao tratar das travestis detentas, Drauzio mistura os pronomes femininos e masculinos. Hoje em dia, esse erro não passaria batido, e eu não acho que Drauzio o cometeria de qualquer forma.

O livro não toma um partido explícito de nenhuma das partes …

reviewed Libras? Que língua é essa? by Audrei Gesser (Estratégias de ensino, #14)

Audrei Gesser: Libras? Que língua é essa? (Paperback, Portuguese language, 2009, Parábola) 5 stars

Ainda é preciso insistir no fato de que a Libras é língua? Desde a década …

Uma introdução à LIBRAS e à cultura surda

5 stars

O livro de Audrei Gesser, ouvinte pesquisador e imerso no contexto da cultura surda, destina-se principalmente a ouvintes leigos sobre a realidade da pessoa surda no Brasil, com o intuito de servir de introdução a esse universo.

É dividido em três partes: "A língua de sinais", "O surdo" e "A surdez". A primeira parte é essencial para o leitor desmistificar erros no senso comum do que seria a LIBRAS e as línguas de sinais como um todo. Em seguida, os outros dois capítulos abordam aspectos da cultura surda e as disputas políticas em relação ao paradigma médico contra o modelo social da deficiência.

Senti falta no livro de referências a uma parte relevante da comunidade de deficientes auditivos que recusa a identificação com a cultura surda e insiste em ser chamada de deficiente auditivo, procurando compensações como aparelhos auriculares, entre outros. Existe essa tensão entre deficientes auditivos e surdos, e …

Lalo Watanabe Minto: O Avesso das Evidências (Paperback, português language, 2023, Lutas Anticapital) 5 stars

Educação baseada em evidências se tornou uma espécie de slogan que, crescentemente, vem dando forma …

Educação Baseada em Evidências: "repetitiva, insistente, monótona"

5 stars

Sou suspeitíssima para falar do Lalo, o autor do livro, porque ele foi meu orientador de iniciação científica e é uma excelente pessoa. Assim como o faz em suas aulas, no livro ele coloca nome nos bois sem medo.

A Educação Baseada em Evidências (EBE) é, para o autor, um movimento não epistemológico de disputa científica e sim um movimento político entranhado no modus operandi neoliberal. Lalo nos mostra como a EBE bebe da teoria do capital humano diretamente, renomeando e acelerando processos que já são velhos conhecidos de professores, gestores educacionais e pesquisadores críticos. Mais do que propor uma abordagem científica da educação, os proponentes da EBE descartam e subjugam as já estabelecidas linhas de pesquisa em faculdades de educação como anti-científicas e pseudocientíficas. Além disso, nutrem-se de lógicas circulares que buscam, a partir de dados matemáticos e estatísticos, justificar as premissas que eles mesmos julgaram corretas de início. …

reviewed Autismo by Valério Romão (Paternidades falhadas, #1)

Valério Romão: Autismo (Hardcover, português language, 2018, Tinta da China Brasil) 4 stars

“Eu acho que o Henrique é Faltava só uma palavra, era o parto ao contrário, …

Essa não é uma história de superação

4 stars

Content warning Contém spoilers substanciais e sobre o final do livro, aborda temas muito pesados de capacitismo

reviewed Admirável Mundo Novo by Aldous Huxley (Folha Grandes Nomes da Literatura, #3)

Aldous Huxley: Admirável Mundo Novo (Hardcover, português language, 2016, Folha de S. Paulo) 4 stars

"Admirável Mundo Novo", do escritor britânico Aldous Huxley (1894-1963), lançado em 1932, exerceu uma influência …

Sofri de CED, "Criei Expectativas Demais"

3 stars

Esse livro é um clássico do gênero ficção científica distópica, e já em 1932 já previa algumas desgraças em nome do progresso científico. Aliás, se tem uma coisa em que o livro acerta, é na crítica implícita (ou até mesmo explícita) sobre ciência e o progresso obstinado. O dilema moral principal do livro, escrito mesmo antes da Segunda Guerra ou da ameaça de caos nuclear da Guerra Fria, é: ser livre e sofrer, mas poder apreciar a arte e a liberdade e tudo o que implica, ou ser condicionado, manipulado e viver em uma sociedade de castas, mas sem sofrimento e uma vida relativamente digna e feliz (mesmo considerando as castas)?

Na minha opinião, esse dilema moral é realmente interessante e se prova atual mesmo 92 anos após o lançamento do livro. O que eu não gostei foi:

1) A narrativa: achei chata, não me interessou, os personagens não são …

Isabelle Stengers, Bernadette Bensaude-Vincent: História da Química (Paperback, português language, 2023, Editora da Unicamp) 4 stars

O estilo narrativo empregado pelas autoras não decepcionará o leitor de livros de história das …

História da Química para químicos

4 stars

Quem me apresentou esse livro, por conhecer a autora Isabelle Stengers, foi meu companheiro que é antropólogo. Ele ficou particularmente interessado ao ver que a Editora da Unicamp publicou a primeira tradução em PT-BR (ou, carinhosamente, brasileiro) desse livro lançado inicialmente em 1993 em francês.

Comecei a ler particularmente interessada em um tópico da história da química: o desenvolvimento do que chamamos de modelos atômicos, e as controvérsias em torno do átomo desde o marco do "átomo de Dalton" (1808). As autoras abordam essas questões, mas um pouco menos do que eu gostaria. O átomo recebe particular atenção em dois capítulos: 17 ("A análise em face dos átomos") e 30 ("Dos átomos ao átomo"). Um dos tópicos que mais me interessa, a descoberta do elétron por parte de Thomson (1897), recebeu pouca atenção das autoras. Nesse aspecto, o desenvolvimento da história do átomo como uma narrativa surrupiada e controlada pela …

Fyodor Dostoevsky: Crime e Castigo (Paperback, português language, 2007, L&PM Pocket) 5 stars

Um dos romances mais importantes, mais lidos e festejados da literatura, Crime e castigo (publicado …

"Crime é não ler essa obra, castigo é terminar de ler ela"

5 stars

Cito uma pessoa querida do Mastodon fazendo um trocadilho com o título da obra de Dostoiévski ainda no título da resenha. E o faço porque na minha opinião ela está certa: é um crime não ler Crime e Castigo, pela sua relevância histórica e excelente construção narrativa e literária. Castigo foi terminar de ler um livro de 600 páginas, de bolso ainda, com tipografia minúscula e linhas apertadas.

Penso que, se tivesse umas 100 páginas a menos (e olha que aí seriam 500 páginas nessa edição da L&PM que avalio, não exatamente um livro pequeno), a história teria rolado um pouco menos enfadonha em alguns pontos. Mas Dostoiévski "macetou" aqui, como dizem os jovens. É um romance que marca muito bem o pensamento conservador russo e a grande influência do cristianismo ortodoxo russo no pensamento do autor. Aqui, ele articula um crime como o caso perfeito para avaliar os limites …