Com uma radicalidade lúcida e furiosa que demole qualquer noção conservadora e normativa, Um apartamento …
De acordo com a epistemologia da diferença sexual, a medicina ocidental define a disforia de gênero como a discordância entre o gênero designado no nascimento e o gênero com o qual a pessoa se identifica. A instituição estabelece como condição de possibilidade para o reconhecimento de meu nome masculino que eu me reconheça previamente como disfórico. Aqui ninguém dá nada sem pedir algo em troca. O Estado diz: se você quer um nome, tem de me dar antes o seu uso da razão, sua consciência, sua saúde mental. Você pode acreditar que está sendo chamado por seu nome, mas o Estado estará falando com você como disfórico. Nunca pensei que aceitaria isso. Mas aceito. Renunciei a noções como razão, consciência, saúde mental. Construo-me agora com outras tecnologias do espírito.
Uma colher que desaparece quando colocada no chá quente, uma bizarra corrida pelo ouro causada …
Um livro com altos e baixos (alguns bem baixos)
4 stars
A premissa toda do livro A Colher que Desaparece é ser um livro de curiosidades sobre a história da ciência. Eu adoro história da ciência e eu adoro curiosidades. O problema é quando o autor pega muito nas curiosidades e esquece do rigor da história da ciência. Para mim, de forma resumida, o maior defeito desse livro é ser americano. Algumas coisas que o autor vê como óbvias ou que são simplesmente ignorância da parte dele são extremamente estadunidenses. Por exemplo, na esteira de Karl Popper (o filósofo da ciência preferido de 10 em 10 cientistas das exatas, porque eles não gostam de filosofia, só de fingir que gostam de filosofia), classifica o marxismo como uma pseudociência. Ou então mais de uma vez cita Stálin para provar um ponto que poderia ter sido provado com figuras estadunidenses, porque o americano ama um espantalho soviético para chamar de seu, mesmo no …
A premissa toda do livro A Colher que Desaparece é ser um livro de curiosidades sobre a história da ciência. Eu adoro história da ciência e eu adoro curiosidades. O problema é quando o autor pega muito nas curiosidades e esquece do rigor da história da ciência. Para mim, de forma resumida, o maior defeito desse livro é ser americano. Algumas coisas que o autor vê como óbvias ou que são simplesmente ignorância da parte dele são extremamente estadunidenses. Por exemplo, na esteira de Karl Popper (o filósofo da ciência preferido de 10 em 10 cientistas das exatas, porque eles não gostam de filosofia, só de fingir que gostam de filosofia), classifica o marxismo como uma pseudociência. Ou então mais de uma vez cita Stálin para provar um ponto que poderia ter sido provado com figuras estadunidenses, porque o americano ama um espantalho soviético para chamar de seu, mesmo no século XXI. O autor também parece achar de bom tom defender eugenistas só porque o cientista em questão não era tão ruim assim. Esses defeitos tornam o livro impossível de se recomendar. Mas eu estaria mentindo se dissesse que a contação de história e as curiosidades escolhidas para o livro não me empolgaram bastante. Eu fiquei fascinada principalmente com a última parte do livro, que fala sobre desenvolvimentos da tabela periódica (e agregados) nos últimos anos. Como sempre, me deu uma vontade quase incontrolável de estudar física de partículas (como se eu entendesse de algo disso).
Enfim, na parte de curiosidades, é um livro muito legal. No rigor de história da ciência, mais ou menos. E as partes tipicamente americanas do livro são uma bosta. Mas, no geral, foi uma leitura interessante. E é bem amigável para pessoas leigas, não precisa ser nenhum expert em química para acompanhar. Na verdade, talvez ajude a te acender alguma curiosidade extra se química sempre foi um tormento pra você.
“Meu irmão é adotado, mas não posso e não quero dizer que meu irmão é …
Argentino demais para ser brasileiro, brasileiro demais para ser argentino
4 stars
Esse livro é uma peça de ficção muito autobiográfica de Julián Fuks, um autor brasileiro filho de pais exilados da Argentina durante uma ditadura militar (1976-1983). Digo que é uma ficção muito autobiográfica porque muitas coisas que aparecem no livro no tocante ao protagonista são praticamente idênticas aos dados públicos de Fuks, incluindo o fato de ser filho de exilados políticos argentinos. Onde termina a realidade e começa a ficção e vice-versa é algo que o autor nunca deixou claro, e parte da graça do livro.
É um livro relativamente curto, que traz bastante coisa da psicanálise Winnicottiana, e relaciona as pontes entre traumas relacionados à ditadura e traumas familiares associados ao exílio e à adoção de crianças. Em alguns momentos, eu me irritei com o tom pesaroso que o protagonista assume para si mesmo frente ao seus dilemas com o irmão adotivo, mas da metade para o final o …
Esse livro é uma peça de ficção muito autobiográfica de Julián Fuks, um autor brasileiro filho de pais exilados da Argentina durante uma ditadura militar (1976-1983). Digo que é uma ficção muito autobiográfica porque muitas coisas que aparecem no livro no tocante ao protagonista são praticamente idênticas aos dados públicos de Fuks, incluindo o fato de ser filho de exilados políticos argentinos. Onde termina a realidade e começa a ficção e vice-versa é algo que o autor nunca deixou claro, e parte da graça do livro.
É um livro relativamente curto, que traz bastante coisa da psicanálise Winnicottiana, e relaciona as pontes entre traumas relacionados à ditadura e traumas familiares associados ao exílio e à adoção de crianças. Em alguns momentos, eu me irritei com o tom pesaroso que o protagonista assume para si mesmo frente ao seus dilemas com o irmão adotivo, mas da metade para o final o livro engrena e é bem interessante. Além disso, o tempo inteiro somos encarados pela questão: o que é uma narrativa real, de acordo com os fatos, ou é coisa da memória do protagonista enviesada pelo tempo?
Comecei pensando que não merecia o Jabuti de 2016, mas mudei de ideia. É uma narrativa muito interessante e que expõe feridas pustulentas abertas nas famílias que lidam com o trauma de ditaduras - como a minha.