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Miguel Medeiros

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George Breitman, Malcolm X: Malcolm X Fala (Português language, 2021, Ubu Editora) 3 stars

Os discursos aqui reunidos foram proclamados, com exceção de "Mensagem às bases", entre 1964 e …

Para entender isso, você precisa voltar ao que o jovem irmão aqui chamou de “negro da casa” e “negro do campo”, dos tempos da escravidão. Havia dois tipos de escravos, o negro da casa e o negro do campo. Os negros da casa moravam na casa com o senhor, vestiam-se muito bem e comiam bem porque comiam as sobras da comida do senhor. Eles moravam no sótão ou no porão, mas, mesmo assim, moravam perto do senhor; e eles amavam o senhor mais do que o senhor amava a si mesmo. Eles dariam a própria vida para proteger a casa do senhor – mais rápido até do que o próprio senhor o faria. Se o senhor dissesse “Temos uma boa casa aqui”, o negro da casa diria “Sim, temos uma boa casa aqui”. Sempre que o senhor dizia “nós”, ele dizia “nós”. É assim que se reconhece um negro da casa.

Se a casa do senhor pegasse fogo, o negro da casa se empenharia mais para debelar o incêndio do que o próprio senhor. Se o senhor adoecesse, o negro da casa diria: “Qual é o problema, patrão, a gente tá doente?”. “A gente” doente! Ele se identificava com seu senhor mais do que seu senhor se identificava consigo mesmo. E, se você chegasse para o negro da casa e dissesse “Vamos fugir, vamos escapar, vamos nos separar deles”, o negro da casa olharia para você e diria: “Cara, seu louco. O que você quer dizer com nos separar? Onde é que tem uma casa melhor do que esta? Onde vou poder usar roupas melhores do que estas? Onde vou comer comida melhor do que esta?”. Assim era o negro da casa. Naquela época, ele era chamado de o “nigger10 da casa”. E é assim que também os chamamos hoje, porque ainda temos alguns niggers da casa circulando por aqui.

Esse moderno negro da casa ama seu senhor. Quer morar perto dele. É capaz de pagar três vezes mais do que uma casa vale apenas para morar perto de seu senhor e depois se gabar, dizendo: “Eu sou o único negro aqui”; “Eu sou o único no meu trabalho”; “Eu sou o único nesta escola”. Mas ele não passa de um negro da casa. E, se alguém chega até você agora e diz “Vamos nos separar”, você diz a mesma coisa que o negro da casa dizia lá na plantação. “O que você quer dizer com separar? Da América, desse bom homem branco? Onde a gente vai arranjar um emprego melhor do que este aqui?” Ou seja, é isso o que você diz. “Não deixei nada lá na África”, é o que você diz. Ora, você deixou sua mente na África.

Naquela mesma plantação, estava o negro do campo. Os negros do campo é que eram as massas. Sempre havia mais negros do campo do que negros da casa. O negro do campo vivia num inferno. Comia os restos. Na casa do senhor a comida era de luxo. O negro do campo, por sua vez, não recebia nada além do que restava dos intestinos do porco capado. Eles chamam isso de “miúdos” hoje em dia. Naquela época, chamavam do que realmente era – tripas. É isto que você era – um comedor de tripas. E alguns de vocês ainda são comedores de tripas.

O negro do campo era espancado de manhã até à noite. Ele morava numa choupana, numa cabana. Usava roupas velhas, descartadas. Odiava seu senhor. Estou dizendo que ele odiava o senhor. Ele era inteligente. Aquele negro da casa amava seu senhor, mas o negro do campo… lembrem-se disto, eles eram a maioria e odiavam o senhor. Quando a casa pegava fogo, não tentavam apagar; aqueles negros do campo rezavam por um vento, uma brisa que atiçasse o fogo. Quando o senhor adoecia, o negro do campo rezava para que ele morresse. Se alguém chegasse para o negro do campo e dissesse “Vamos nos separar, vamos fugir”, ele não diria “Para onde vamos?”. Ele diria: “Qualquer lugar é melhor do que aqui”. Nós temos negros do campo na América hoje, sim. Eu sou um negro do campo. As massas são os negros do campo. Quando a casa do branco está pegando fogo, você não ouve os negros dizendo “Nosso governo está com problemas”. Eles dizem: “O governo está com problemas”. Imagine um negro: “Nosso governo”! Já ouvi até mesmo um deles dizer “nossos astronautas”. Ora, eles não te deixam nem chegar perto daquele maquinário – e “nossos astronautas”! “Nossa Marinha” – eis aí um negro sem noção, um negro sem noção nenhuma.

Assim como o senhor de escravos daquela época usava o negro Pai Tomás da casa para manter os negros do campo sob controle, o mesmo velho senhor de escravos de hoje tem negros que nada mais são do que os modernos Pais Tomás, os Pais Tomás do século XX, para manter você e a mim sob controle, para nos manter sob controle, nos manter passivos e pacíficos e não violentos. Eis aí o Pai Tomás tornando você não violento. É como quando você vai ao dentista e o sujeito vai tirar seu dente. Você vai se defender quando ele começar a puxar. Então, ele injeta na sua gengiva uma coisa chamada novocaína, para que você pense que não estão fazendo nada contra você. Lá está você sentado, com toda aquela novocaína na gengiva, sofrendo quieto. O sangue escorrendo pela sua gengiva toda e você não sabe o que está acontecendo. Porque alguém ensinou você a sofrer quieto.

Malcolm X Fala by ,

George Breitman, Malcolm X: Malcolm X Fala (Português language, 2021, Ubu Editora) 3 stars

Os discursos aqui reunidos foram proclamados, com exceção de "Mensagem às bases", entre 1964 e …

A revolução é sangrenta, a revolução é hostil, a revolução não faz concessões, a revolução derruba e destrói tudo o que estiver em seu caminho. E você aqui, sentado, pregado como uma saliência na parede, dizendo: “Vou amar essas pessoas, não importa o quanto elas me odeiem”. Não! Você precisa é de uma revolução. Quem já ouviu falar de uma revolução em que as pessoas se dão as mãos, como disse perfeitamente o pastor Cleage, cantando “We Shall Overcome”?9 Não é assim que se faz uma revolução. Você não canta, você está muito ocupado tendo que se virar. Tudo é baseado na terra. Um revolucionário quer terras para fundar sua própria nação, uma nação independente. Aquelas pessoas da “Revolução dos Negros” não estão pedindo nação nenhuma – elas estão é tentando rastejar de volta para a plantação.

Malcolm X Fala by ,

George Breitman, Malcolm X: Malcolm X Fala (Português language, 2021, Ubu Editora) 3 stars

Os discursos aqui reunidos foram proclamados, com exceção de "Mensagem às bases", entre 1964 e …

De todos os nossos estudos, é a história a mais qualificada para confirmar nossas pesquisas. Quando você compreende que tem problemas, tudo o que precisa fazer é verificar o método histórico usado em todo o mundo por outras pessoas que têm problemas semelhantes aos seus. Depois de ver como elas resolveram os delas, você saberá como resolver os seus. Há uma revolução, uma Revolução Negra, acontecendo na África. No Quênia, os Mau-Mau7 foram revolucionários; foram eles que trouxeram a palavra “Uhuru”8 à tona. Os Mau-Mau… eram revolucionários, acreditavam na terra arrasada, tiravam da frente tudo o que estava em seu caminho, e sua revolução também era baseada na terra, numa ânsia por terra. Na Argélia, região norte da África, ocorreu uma revolução. Os argelinos eram revolucionários, queriam terras. A França ofereceu permissão para serem integrados à França. E eles disseram à França: “Que se dane a França”; queriam um tanto de terras, não um tanto da França. E travaram uma batalha sangrenta.

Malcolm X Fala by ,

George Breitman, Malcolm X: Malcolm X Fala (Português language, 2021, Ubu Editora) 3 stars

Os discursos aqui reunidos foram proclamados, com exceção de "Mensagem às bases", entre 1964 e …

Eu gostaria de fazer alguns comentários sobre a diferença entre a “Revolução Negra” e a “Revolução dos Negros”.5 Elas são iguais? E, se não são, qual é a diferença? Qual é a diferença entre uma “Revolução Negra” e uma “Revolução dos Negros”? Primeiro, o que é uma revolução? Às vezes, tenho inclinação a acreditar que muitos dos nossos estão usando esta palavra, “revolução”, em vão, sem atentar cuidadosamente para o que essa palavra realmente significa e quais são suas características históricas. Quando você estudar a natureza histórica das revoluções, o motivo de uma revolução, o objetivo de uma revolução, o resultado de uma revolução e os métodos usados em uma revolução, aí pode ser que você troque a palavra. Pode ser que você se envolva em outro programa, que mude de objetivo e mude de ideia.

Veja a Revolução Americana de 1776. Por que aconteceu aquela revolução? Por terra. Por que eles queriam terras? Independência. Como se deu a revolução? Com derramamento de sangue. Motivo número 1: foi baseada na terra, a base da independência. E a única maneira que tinham de conseguir isso era com derramamento de sangue. E a Revolução Francesa, no que se baseou? Os sem-terra contra os latifundiários. E por que aconteceu aquela revolução? Terra. E como conseguiram? Com derramamento de sangue. Foi sem amor nenhum, sem concessão, sem negociação. Estou lhe dizendo: você não sabe o que é uma revolução. Porque, quando você descobrir o que é, vai voltar para o beco, vai sair do caminho.

A Revolução Russa foi baseada em quê? Terra. O sem-terra contra o latifundiário. Como eles resolveram a coisa? Com derramamento de sangue. Não existe revolução que não envolva derramamento de sangue. E você tem medo de sangrar. Eu disse: você tem medo de sangrar!

Quando o homem branco mandou você para a Coreia, você sangrou. Ele mandou você para a Alemanha, e você sangrou. Ele mandou você para o Pacífico Sul para lutar contra os japoneses, e você sangrou. Você sangra pelos brancos, mas, quando se trata de ver suas próprias igrejas sendo bombardeadas e garotinhas negras assassinadas, não tem sangue. Você sangra quando o homem branco diz “sangre”; você morde quando o homem branco diz “morda”; e você late quando o homem branco diz “lata”. Odeio dizer isso sobre nós, mas é verdade. Como você vai ser não violento no Mississippi se foi tão violento na Coreia? Como se pode justificar ser não violento no Mississippi e no Alabama quando suas igrejas estão sendo bombardeadas e suas filhinhas estão sendo assassinadas e, ao mesmo tempo, você vai ser violento contra Hitler, contra Tojo e contra alguém que você nem mesmo conhece?

Se a violência está errada na América, a violência está errada no exterior. Se é errado ser violento defendendo mulheres negras e crianças negras e bebês negros e homens negros, então é errado que a América nos convoque e nos torne violentos no exterior em sua defesa. E, se é certo que a América nos convoque e nos ensine como ser violentos em sua defesa, então é certo que você e eu façamos o que for necessário para defender nosso próprio povo bem aqui, neste país.

A Revolução Chinesa: eles queriam terras. Expulsaram os britânicos, junto com o Pai Tomás6 chinês. Sim, expulsaram. Deram um bom exemplo. Quando eu estava na prisão, li um artigo – não fiquem chocados por eu dizer que estive na prisão. Vocês ainda estão na prisão. É isto que a América significa: prisão. Quando eu estava na prisão, li um artigo na revista Life mostrando uma garotinha chinesa de nove anos; o pai dela estava ajoelhado, de quatro no chão, e ela puxava o gatilho porque ele era um Pai Tomás chinês. Quando fizeram a revolução lá, pegaram uma geração inteira de Pais Tomás e simplesmente os exterminaram. E em dez anos aquela garotinha se tornou uma mulher adulta. Basta de Pais Tomás na China. E hoje a China é um dos mais duros, brutais e temidos países do planeta: temido pelo homem branco. Porque não há nenhum Pai Tomás lá.

Malcolm X Fala by ,

George Breitman, Malcolm X: Malcolm X Fala (Português language, 2021, Ubu Editora) 3 stars

Os discursos aqui reunidos foram proclamados, com exceção de "Mensagem às bases", entre 1964 e …

Em vez de expor nossas diferenças em público, temos que compreender que somos todos a mesma família. E, quando você tem uma discórdia em família, você sabe que roupa suja se lava em casa. Se você sai para a rua brigando, todo mundo te chama de bruto, bronco, não civilizado, selvagem. Se a briga não começar em casa, você que a resolva dentro de casa; entre no armário, discuta a portas fechadas. E então, quando você sair para a rua, vai agir como alguém que faz parte de uma frente comum, uma frente unida. E é isso que precisamos fazer na comunidade, na cidade e no estado. Precisamos parar de expor nossas diferenças diante do homem branco, colocá-lo fora de nossas reuniões e, depois, sentar e negociar uns com os outros. Isso é o que temos que fazer.

Malcolm X Fala by ,

Eduardo Galeano: As Veias Abertas da América Latina (Paperback, Português language, 2010, L&PM) No rating

Remontando a 1970, sua primeira edição, atualizada em 1977, quando a maioria dos países do …

Como sempre, no entanto, quando o Estado se torna dono da principal riqueza de um país, convém perguntar quem é o dono do Estado. A nacionalização dos recursos básicos, por si só, não implica a redistribuição da receita em proveito da maioria, nem põe necessariamente em perigo o poder nem os privilégios da minoria dominante.

As Veias Abertas da América Latina by  (Page 351)

Eduardo Galeano: As Veias Abertas da América Latina (Paperback, Português language, 2010, L&PM) No rating

Remontando a 1970, sua primeira edição, atualizada em 1977, quando a maioria dos países do …

De igual modo, os comentários mais favoráveis que este livro recebeu não provêm de nenhum crítico de prestígio, mas das ditaduras militares que o elogiaram proibindo-o. Por exemplo, As veias não pode circular em meu país, o Uruguai, nem no Chile, e na Argentina as autoridades o denunciaram, na televisão e nos jornais, como um instrumento de corrupção da juventude. “Não deixam ver o que escrevo”, dizia Blas de Otero, “porque escrevo o que vejo.”

As Veias Abertas da América Latina by  (Page 347)

Eduardo Galeano: As Veias Abertas da América Latina (Paperback, Português language, 2010, L&PM) No rating

Remontando a 1970, sua primeira edição, atualizada em 1977, quando a maioria dos países do …

Sei que pode parecer sacrílego que este manual de divulgação fale de economia política no estilo de um romance de amor ou de piratas. No entanto, confesso, repugna-me ler algumas obras valiosas de certos sociólogos, politicólogos, economias ou historiadores, que escrevem em código. A linguagem hermética nem sempre é o preço inevitável da profundidade. Em alguns casos pode esconder, simplesmente, a incapacidade de comunicação elevada à categoria de virtude intelectual. Suspeito de que assim o enfado, com frequência, serve para bendizer a ordem estabelecida: confirma que o conhecimento é um privilégio das elites.

Algo parecido, diga-se de passagem, costuma ocorrer com certa literatura militante dirigida a um público complacente. Parece-me conformista, a despeito da toda a sua possível retórica revolucionária, uma linguagem que mecanicamente repete, para os mesmos ouvidos, as mesmas frases feitas, os mesmos adjetivos, as mesmas fórmulas declamatórias. Talvez essa literatura de paróquia esteja bem longe da revolução quanto a pornografia está longe do erotismo.

As Veias Abertas da América Latina by  (Page 347 - 348)