Marte started reading Miss Davis by Sybille Titeux de la Croix

Miss Davis by Sybille Titeux de la Croix, Amazing Améziane
Negra. Ativista. Revolucionária. Angela Davis é uma das maiores ativistas do nosso tempo. Sua história de vida e sua luta …
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Negra. Ativista. Revolucionária. Angela Davis é uma das maiores ativistas do nosso tempo. Sua história de vida e sua luta …
Depois do sucesso de A origem do mundo, Liv Strömquist está de volta numa poderosa e necessária reflexão sobre o …
Tinha lido esse livro cerca de um ano atrás na versão de e-book -- que inclusive está integralmente disponível no site da crocodilo edições, o que é bem justo com a proposta anárquica do livro, que é uma coletânea de textos. O contexto de escrita desses textos é justamente os levantes que se deram com a Bash Back!, uma "proposta de propagação de práticas libertárias e ações diretas, pela expansão de uma rede anti-hierárquica de levantes descentralizados, compostos por táticas múltiplas de antiopressão e antiassimilação" (como escreve Flávia Lucchesi no prefácio brasileiro), no contexto estadunidense ali pelo final dos anos 2000/começo dos anos 2010.
Quando li pela primeira vez, senti uma empolgação visceral, um impulso de querer procurar por uma organização, mas também querer iniciar uma insurreição. Esse sentimento se mantém nessa segunda leitura, agora em versão física, motivo pelo qual estou aumentando minha avaliação de 4/5 para 5/5.
As …
Tinha lido esse livro cerca de um ano atrás na versão de e-book -- que inclusive está integralmente disponível no site da crocodilo edições, o que é bem justo com a proposta anárquica do livro, que é uma coletânea de textos. O contexto de escrita desses textos é justamente os levantes que se deram com a Bash Back!, uma "proposta de propagação de práticas libertárias e ações diretas, pela expansão de uma rede anti-hierárquica de levantes descentralizados, compostos por táticas múltiplas de antiopressão e antiassimilação" (como escreve Flávia Lucchesi no prefácio brasileiro), no contexto estadunidense ali pelo final dos anos 2000/começo dos anos 2010.
Quando li pela primeira vez, senti uma empolgação visceral, um impulso de querer procurar por uma organização, mas também querer iniciar uma insurreição. Esse sentimento se mantém nessa segunda leitura, agora em versão física, motivo pelo qual estou aumentando minha avaliação de 4/5 para 5/5.
As questões expostas em BB! Ultraviolência queer são demasiado complexas para serem tratadas integralmente em uma resenha, de forma que só posso incentivar a leitura do livro. Mas dá para começar a levantar essas questões aqui, o que farei.
Uma das temáticas centrais do livro, e da própria Bash Back! em si, é a divergência entre o que entendemos por manadas queer e movimento LGBTQ+. As manadas clamam o queer enquanto uma existência libertária, anticapitalista, antiestatal, anti-heteronormativa, antiassimilacionista. Em outras palavras, não é uma junção de pessoas com identidades convergentes, expressas de forma pasteurizada em uma "sopa de letrinhas", e sim uma prática e uma existência (a)política. Até porque há mais em comum entre uma travesti moradora de rua e um morador de rua "heterossexual" do que entre a mesma travesti e um Eduardo Leite da vida. Os textos escolhidos para o livro são todos anônimos, escrevidos de preferência enquanto colocações coletivas, o que reforça esse caráter libertário.
Lucchesi, no prefácio, traz algumas experiências que podem ser comparadas com a Bash Back! estadunidense. Uma delas representa, na minha opinião, perfeitamente a imagem que o livro está querendo trazer. No Rio de Janeiro, em 2013, plena Jornada Mundial da Juventude, um evento da Igreja Católica em que o Papa estava presente, duas pessoas participantes da Marcha das Vadias fizeram uma performance considerada "violenta" por grupos presentes, e também pela sociedade cristã em geral. Eles quebraram diversas imagens de santos católicos e, nus, inseriram um crucifixo no ânus do outro. Com certeza, as imagens chocam quando estamos acostumados a ver isso enquanto violência e não o constante vilipêndio das vidas queer. O casal acabou sendo denunciado pelo Ministério Público, sendo criminalizado via judicial.
Bash! Back não é sobre revidar a partir da posição de vítima, uma posição que é reivindicada por diversos grupos identitários. É sobre revidar agressões, mas também puxar as brigas, agredir, cometer crimes para sobrevivência. "Eu-Não-Revido-No-Soco-Eu-Atiro-Primeiro". Nada disso é levado de forma leviana no livro, mas sim explicitando o poder inflamatório de uma insurreição e também a necessidade de criação de manadas (de pessoas, especialmente queer) que se protegem de qualquer forma possível. Se isso significa chocar a sociedade moralmente correta, que seja. Por isso, destaco a frase: "Lenin e Marx nunca transaram dos jeitos que a gente transa". Abraçar o prazer, o puro prazer físico e sensual, também é uma colocação (a)política em uma sociedade que se pune por isso. O sexo, o foder, o chupar, tudo isso faz parte da vida reivindicada por esses grupos.
Algumas pessoas podem estranhar os constantes embates presentes no livro entre queer e identitarismo (no sentido de abraçar identidades fechadas em si como colocações políticas), esse último cristalizado no movimento LGBTQ+. Uma parcela queer extremamente vocal e cansada tem denunciado continuamente o assimilacionismo promovido pelo movimento LGBTQ+, que transforma a identidade em mais um produto capitalista. Para abordar essas questões, os textos dialogam direta e indiretamente com autores como Foucault (biopolítica), Deleuze (devir, beleza, corpo sem órgãos...), Butler (teoria queer negativa versus feminismo positivo), Nietzche (niilismo). As manadas veem na antipolítica uma possibilidade de destruição verdadeira do capitalismo, não uma simples reforma.
Um exemplo desse assimilacionismo é o ataque à memória de insurreições como Stonewall, que são vistas como exemplos radicais a serem seguidos, mas quando grupos e/ou manadas partem para a insurreição, são boicotados pelo movimento LGBTQ+ reacionário ou por grupos anarquistas heteronormativos, que são ambos duramente criticados no livro.
Claro que um livro escrito majoritariamente por queers e figuras transfemininas em geral não pode deixar falar do laço social com a prostituição. A teoria puta aparece no livro como um lembrete sobre como o lumpenproletariado, no conceito marxista, resiste e está armado contra o reacionarismo, sendo crucial para um processo insurrecional revolucionário, ao contrário do envisionado no Manifesto Comunista (Marx, Engels).
Está presente também uma crítica contumaz à Academia com letra maiúscula. De forma astuta, as manadas criticam a intromissão de "pessoas queer radicais provenientes de faculdades liberal arts", responsabilizando-as como parte do motivo pela derrocada das Bash Back! com seu pacifismo irritante e descontextualizado da teoria puta e traveca. Há uma grande apresentação do conceito de transfeminismo insurrecional em oposição a esse agrupamento queer cheio de teoria e pouca prática: "a greve de gênero é uma greve humana", "leia menos, lute mais", "morte à academia". Não se trata de recusar a teoria queer ou qualquer outro conceito da academia, mas de extirpá-lo desse espaço exclusivo e trazer para a insurreição.
Em resumo, Bash Back! é um livro ácido, direto e virulento. E não poderia ser diferente. Trata-se de buscar o que é nosso por direito, choque a quem chocar. Não se trata de glorificar a violência e a putaria, mas de desestigmatizá-las enquanto poderosas ferramentas de libertação queer.
Depois do sucesso de A origem do mundo, Liv Strömquist está de volta numa poderosa e necessária reflexão sobre o …
(...) “Bash”, verbo inglês cuja tradução pode ser: bater com força ou criticar severamente. “Back”, advérbio da mesma língua, pode …
(...) “Bash”, verbo inglês cuja tradução pode ser: bater com força ou criticar severamente. “Back”, advérbio da mesma língua, pode …
Li MAUS duas vezes esse ano.
As duas foram desconfortáveis, mas na segunda leitura, consegui prestar mais atenção em detalhes que passaram um pouco batidos na sede de ver como a história terminava. Histórias em quadrinhos são minhas preferidas porque conseguem passar certos detalhes que só consigo notar em texto com maior dificuldade. Não consigo imaginar Maus sendo em outro formato. Parte da sacada de Spiegelman é a representação de humanos como animais antropomorfizados. Judeus são ratos, alemães não-judeus são gatos, poloneses são porcos, estadunidenses são cachorros, franceses são sapos, suecos são cervos... Além da óbvia metáfora entre caçador e caçado, entre rato e gato, Spiegelman força os próprios estereótipos pseudocientíficos de raça. Por exemplo, a esposa francesa de Spiegelman, convertida ao judaísmo, pede para ser representada por rato dentro da própria narrativa. Mas quem é ela, e onde ela se insere no jogo de raças da Europa?
Raças humanas …
Li MAUS duas vezes esse ano.
As duas foram desconfortáveis, mas na segunda leitura, consegui prestar mais atenção em detalhes que passaram um pouco batidos na sede de ver como a história terminava. Histórias em quadrinhos são minhas preferidas porque conseguem passar certos detalhes que só consigo notar em texto com maior dificuldade. Não consigo imaginar Maus sendo em outro formato. Parte da sacada de Spiegelman é a representação de humanos como animais antropomorfizados. Judeus são ratos, alemães não-judeus são gatos, poloneses são porcos, estadunidenses são cachorros, franceses são sapos, suecos são cervos... Além da óbvia metáfora entre caçador e caçado, entre rato e gato, Spiegelman força os próprios estereótipos pseudocientíficos de raça. Por exemplo, a esposa francesa de Spiegelman, convertida ao judaísmo, pede para ser representada por rato dentro da própria narrativa. Mas quem é ela, e onde ela se insere no jogo de raças da Europa?
Raças humanas não existem. Por isso, os limites de quem é rato e quem não é são tão fluidos na obra de Spiegelman. Inclusive, na segunda parte, escrita após a publicação da primeira parte (aqui, elas são publicadas juntas), Spiegelman se auto-retrata usando uma máscara de rato sobre um rosto humano. O simplismo determinista que coloca um grupo como vítima e outro grupo como algoz sem nenhum nuance não está presente em MAUS. Obviamente, os judeus foram as principais vítimas do genocídio perpetuado pelos nazistas, aqui não cabe nenhum relativismo. Entretanto, a idealização de vítima quase como um anjo heroico é distante da realidade. A realidade do Holocausto impede a construção de idealizações. Como diz o próprio Vladek Spiegelman, "Amigos? Seus amigos? Se trancar elas em um quarto por uma semana, aí ia ver o que é amigo".
Na minha percepção, esse ponto é demonstrado diversas vezes pela obra nas interações entre personagens. Uma amiga me disse ainda hoje que não consegue entender "colonizado que se mete com neonazismo". Eu disse pra ela, muito sério, que sujos são sempre os outros. Como a existência do ariano é só um devaneio sem fatos para sustentar sua realidade, todo mundo tem um motivo para se achar ariano, i.e. o produto mais avançado da seleção natural... Até agora.
Outra coisa que eu acho importante nesse livro é a construção de Art com seus familiares, principalmente seu pai e sua madrasta, e o fantasma de sua mãe. O livro não busca esconder os problemas de relacionamento entre as partes envolvidas, que são profundamente afetadas pelo trauma intergeracional produzido pelo Holocausto. Como o próprio autor prefere se referir, o livro é acima de tudo um livro para análise de relações humanas.
Em resumo, MAUS é um livro sobre nazismo, mas também um livro sobre relações sociais em momentos de mais profundo desespero, de relações familiares afetadas por trauma intergeracional, e um excelente exemplar de como utilizar quadrinhos para narrar histórias que nos marcam, inclusive as que marcam literalmente.
Impressionante. Um dos meus livros favoritos para a vida.
Maus ("rato", em alemão) é a história de Vladek Spiegelman, judeu polonês que sobreviveu ao campo de concentração de Auschwitz, …
Maus ("rato", em alemão) é a história de Vladek Spiegelman, judeu polonês que sobreviveu ao campo de concentração de Auschwitz, …
O Manifesto é, como já estamos carecas de saber, um texto com caráter mais panfletário e menos profundo do que as outras obras de Marx (e Engels). Na minha opinião, o Manifesto peca em um lugar, pelo menos: a insistência de Marx no proletariado como a única classe capaz de trazer a emancipação da população das garras dos burgueses, em contraste com o que ele mesmo coloca como campesinato, lumpenproletariado, etc. Marx, por que você odeia tanto o campesinato, meu bem? É impossível falarmos do comunismo no Brasil do século XXI sem pensar no campesinato, por exemplo. E para mim o lumpenproletariado não é reacionário como Marx julga ser. Bom, eu preciso aprofundar minhas leituras em Marx antes de voltar nesse ponto, admito. Cenas dos próximos capítulos.
A leitura do Manifesto serve como chave para compreender a história dos homens numa virada de século. Um espectro assombra …
A leitura do Manifesto serve como chave para compreender a história dos homens numa virada de século. Um espectro assombra …
Content warning Assuntos sensíveis: racismo
Eu não sou partidária da ideia de simplesmente descartar livros porque eles envelheceram mal. Na minha opinião, livros são ideias encadeadas e ideias devem ser analisadas em seu contexto histórico.
Na última resenha de Píppi Meialonga, em Píppi a Bordo, relatei os choques em relação ao colonialismo europeu na obra de Astrid Lindgren. Em Píppi nos mares do sul, o embate continua. Dividida entre passar o tempo na Vila Vilekula, na Suécia, e em Currecurredutina, uma ilha no Oceano Atlântico Sul, Píppi segue fazendo o que sabe fazer de melhor: ensinar aos adultos que criança também é gente. É essa parte da obra de Lindgren que me fez fascinada quando criança e que gosto até hoje. O problema gigante é que uma obra sueca dos anos 1940 deixa a desejar na questão racismo e colonialismo. Mais uma vez, toda a relação entre os suecos e os habitantes da fictícia Currecurredutina, descritos explicitamente como negros, é permeada desses vícios, que incluem uma passagem lamentável narrando como os currecurredutões acharam a pele branca "mais bonita que a deles". Mantenho a sugestão de que a leitura não deve ser evitada, mas lida com a devida crítica junto com a criança leitora, sabendo analisar sem anacronismos, mas com criticidade, uma obra dos anos 1940.
Píppi Meialonga, a menina de tranças ruivas espetadas e rosto sardento, é a pessoa mais famosa de sua pequena cidade, …
Píppi Meialonga, a menina de tranças ruivas espetadas e rosto sardento, é a pessoa mais famosa de sua pequena cidade, …