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Miguel Medeiros

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"Este mundo grande cansa-me à exaustão o pequeno corpo.". — Pórcia

Sou um leigo que se entrega à filosofia, literatura, história e ciência. Leitor de Philip K. Dick a Platão, ouvinte de Arctic Monkeys a John Coltrane, jogador de Red Dead Redemption a Deus Ex.

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Theodor W. Adorno: Introdução à dialética (Paperback, Português language, 2012, Unesp) No rating

Dialética é uma orientação na filosofia cujas motivações se entrelaçam com a própria origem do …

Hegel, ao contrário do que sempre lhe foi acusado de maneira tão vulgar, não agiu como se porventura tivesse abandona do a lógica formal e filosofasse sem qualquer tipo de controle, corno se não houvesse princípio// de contradição. Isso significaria virar Hegel de cabeça para baixo. Primeiramente, Hegel de fato presume o princípio de contradição para o âmbito do conhecimento usual baseado no entendimento [dieüblicbe Verstandeserkenntnis], tanto para conhecimentos empíricos mais básicos quanto para a lógica formal, como também para qualquer outro pensamento. Contudo, quando me comporto corno quem reflete [Reflektierender], isto é, quando não me oriento apenas, por assim dizer, pela atenção direta [ingerader Einstellung] a proposições formais ou conteúdos, mas penso, antes, de modo penetrante, a própria relação entre os momentos, então eu chego, de fato, ao resultado de que a forma, sob a qual eles podem ser compreendidos, é precisa e unicamente a própria forma da contradição, e não a forma entendida corno identidade vazia. Assim, não se trata de renegar [verleugnen] a contradição entre forma e conteúdo ou qualquer outra contradição: ao contrário, ela permanece vigente para o conhecimento finito e limitado. Mas, quando esse conhecimento exige sua autoconsciência, refletindo-se a si próprio, ele chega ao resultado de que a contradição, que ele precisa ter em mãos corno critério da correção, é simultaneamente o órganon da verdade, isto é, que cada conhecimento singular somente se torna propriamente conhecimento ao atravessar a contradição. Eis aí então em que consiste a derivação desse princípio negativo, desse princípio da contradição, a partir da doutrina kantiana das antinomias, tal como aparece em Hegel.

Introdução à dialética by  (Page 207 - 208)

Theodor W. Adorno: Introdução à dialética (Paperback, Português language, 2012, Unesp) No rating

Dialética é uma orientação na filosofia cujas motivações se entrelaçam com a própria origem do …

"Reflexão" não significa, a princípio, outra coisa senão "espelhamento". Em outras palavras, a reflexão em Kant significa, num primeiro momento, que nossa razão toma em consideração a própria razão, comportando-se diante da razão de maneira propriamente crítica. Aquilo que Hegel e, em geral,// os idealistas pós-kantianos fazem, aquilo que caracteriza de modo crucial sua diferença em relação a Kant, reside no fato de que para eles essa reflexão não se realiza de forma inconsciente, tal como nos em- piristas ingleses. Ou seja, nesses filósofos alemães, a razão, por assim dizer, não apenas se olha no espelho; antes, esse ato de reflexão, ou essa capacidade de reflexão, torna-se ela mesma um tema para a filosofia. Isso significa que, a partir de então, sustenta-se de modo enfático que aquela força, pela qual a razão se torna capaz de conhecer-se a si mesma, ao mesmo tempo consiste e tem de necessariamente consistir na força por meio da qual ela pode ir além de si mesma em sua própria finitude. E precisamente por meio dessa força, ela volta, por fim, a si mesma, tornando-se justamente por isso uma [razão] infinita. Podemos dizer que se trata aqui da reflexão da reflexão, tal como Schlegel certa vez o formulou; ou seja, trata-se da consciência que se tornou infinita em si mesma, a consciência refletida infinitamente em si mesma, a qual perfaz propriamente o pressuposto dessa filosofia enquanto tal. Se vocês desejam ter agora uma definição simples - caso eu possa aqui empregar tal expressão -, uma determinação simples do conceito central da filosofia hegeliana, que a diferencia da filosofia kantiana - a saber, o conceito de especulação -, então a consciência especulativa seria, em oposição à consciência simples ou à consciência simplesmente reflexionante [riflektierend], aquela em que esse momento da reflexão da consciência se torna tema para ela mesma, o ponto em que ela alcança sua própria autoconsciência. É por causa disso que, já no princípio da análise do conhecimento, ela se depara com aquilo que então resultará no objeto por excelência [Hauptgegenstand] dessa dialética, a saber: a diferença entre sujeito e objeto [Objekt], a qual, nessa duplicação que lhe é característica, encontra-se já presente na reflexão. Pois, de um lado, vocês têm realmente aqui o pensar como objeto [Objekt], como aquilo que é tomado em consideração, que é analisado, tal como se denomina em Kant; de outro lado, vocês têm também o pensar como sujeito, isco é, o pensar que toma a si mesmo em consideração. Trata-se, caso queiram, do princípio propriamente transcendental, o princípio da síntese da apercepção, o princípio sintético propriamente dito. // E ambos os princípios estarão, dessa maneira, conectados um ao outro.

Essa posição completamente nova e central do conceito de reflexão é aquilo que constitui o órgão dessa filosofia, e nós veremos que esse momento da reflexão realmente é idêntico - e esta é a resposta que lhes darei à questão que nos propusemos aqui -, que esse princípio da reflexão que se sabe a si mesma é de fato idêntico ao princípio da negação. Esse princípio - e se trata também aqui, em Hegel, assim como em muitas outras coisas, da retomada de um motivo antigo, aristotélico, a saber: o pensar do pensar, não é ele mesmo, em Hegel, outra coisa senão o princípio da negatividade posto em execução [ausgiführt].

Introdução à dialética by  (Page 200 - 203)

Byung-Chul Han: O espírito da esperança (Portuguese language, Editora Vozes) No rating

Em um mundo repleto de desafios, crises e incertezas, o filósofo Byung-Chul Han nos convida …

A esperança cristã não encontra lugar na imanência do agir, mas na transcendência da fé. Em sua Teologia da esperança, Jürgen Moltmann escreve: A esperança cristã se orienta para um novum ultimum, para a recriação de todas as coisas pelo Deus da ressurreição de Cristo. Assim, ela abre um horizonte futuro abrangente, que inclui até mesmo a morte, um horizonte no qual ela pode e deve inserir também as esperanças e renovações limitadas da vida, despertando-as, relativizando-as e dando-lhes direção49. A esperança cristã não leva à passividade inativa. Pelo contrário, ela impulsiona à ação, estimulando a imaginação para a ação e despertando o “dom da invenção” “ao romper com o antigo e se preparar para o novo”50. Ela não foge do mundo, mas “anseia pelo futuro”51. Sua essência não é a retirada quietista, mas o “cor inquietum” (o coração inquieto). Na esperança, o mundo não é ignorado nem omitido. Pelo contrário, ela o enfrenta em toda sua negatividade e protesta contra ele. Assim, ela alimenta o espírito da revolução: “Sempre a esperança cristã foi, nesse sentido, revolucionariamente eficaz na história intelectual das sociedades alcançadas por ela”52. O espírito da esperança é caracterizado pela resolução de agir. Quem espera é inspirado pelo novo, pelo novum ultimum. A esperança arrisca o salto para uma nova vida.

O espírito da esperança by 

Byung-Chul Han: O espírito da esperança (Portuguese language, Editora Vozes) No rating

Em um mundo repleto de desafios, crises e incertezas, o filósofo Byung-Chul Han nos convida …

A crítica convencional à esperança negligencia sua complexidade e tensões internas. A esperança vai muito além da espera passiva e dos desejos. Entusiasmo e elã são seus traços fundamentais. Ela é até mesmo “um afeto militante” e “hasteia um estandarte”27, com uma inerente determinação para a ação. Ela desdobra elasticidade para a ação. É preciso distinguir entre a esperança passiva, ociosa e fraca e a esperança ativa, diligente e forte. A esperança passiva realmente se assemelha a um desejo sem força. A esperança ativa e forte, no entanto, inspira as pessoas a ações criativas e eficazes. O desejo ou expectativa estão relacionados a um objeto ou uma ocorrência intramundana. Eles são pontuais. A esperança, por outro lado, desenvolve uma narrativa que conduz ações. A extensão e amplidão narrativas a distinguem. Ao contrário do desejo, ela estimula a imaginação narrativa. Ela sonha ativamente. Ao desejo é inerente um sentimento de falta, enquanto a esperança possui uma plenitude própria, uma luminosidade própria. Uma esperança forte não carece de nada. Esperança transbordante não é um oximoro. A esperança é uma força, um impulso. Um desejo, por outro lado, nunca é vigoroso. A quem tem esperança o mundo aparece sob uma luz diferente. Ele recebe da esperança um brilho especial. O desejo ou expectativa não têm esse poder de transformar, revelar e iluminar o mundo. Eles apenas aguardam eventos ou objetos intramundanos que os satisfaçam. Cumprimento ou satisfação são estranhos à esperança. A esperança não está vinculada a um objeto ou a uma ocorrência intramundana. É um estado de ânimo, até mesmo um estado de ânimo fundamental, que determina e afina continuamente a existência humana. Ele até pode ser intensificado para um estado de entusiasmo e exaltação.

O espírito da esperança by 

Byung-Chul Han: O espírito da esperança (Portuguese language, Editora Vozes) No rating

Em um mundo repleto de desafios, crises e incertezas, o filósofo Byung-Chul Han nos convida …

Como o medo isola as pessoas, é impossível ter medo conjuntamente. O medo não cria comunidade, não traz um nós. Nele, cada um está isolado em si só. A esperança, por outro lado, contém uma dimensão do nós. Esperar significa ao mesmo tempo “espalhar esperança”, levar adiante a chama, “nutrir a chama ao redor”15. A esperança é o fermento da revolução, o fermento do novo: Incipit vita nova. Não há revolução do medo. Aqueles que têm medo se submetem ao domínio. Somente na esperança de um mundo diferente e melhor se forma um potencial revolucionário. Se hoje não é possível uma revolução, é porque não sabemos ter esperança, porque permanecemos no medo, porque a vida definha em sobrevivência.

O espírito da esperança by  (Page 21)

Byung-Chul Han: O espírito da esperança (Portuguese language, Editora Vozes) No rating

Em um mundo repleto de desafios, crises e incertezas, o filósofo Byung-Chul Han nos convida …

O medo onipresente de hoje não decorre realmente de uma catástrofe permanente. Somos afligidos sobretudo por medos difusos, que são estruturalmente condicionados e, portanto, não podem ser atribuídos a eventos concretos. O regime neoliberal é um regime do medo. Ele isola o ser humano ao torná-lo empresário de si mesmo. A competição total e a crescente pressão por desempenho erodem a comunidade. O isolamento narcisista gera solidão e medo. Até mesmo nosso relacionamento conosco mesmos está cada vez mais marcado por medos: medo de falhar, medo de não atender às nossas próprias expectativas, medo de não acompanhar o ritmo ou medo de ficar para trás. É justamente esse medo ubíquo que aumenta a produtividade.

O espírito da esperança by 

Byung-Chul Han: O espírito da esperança (Portuguese language, Editora Vozes) No rating

Em um mundo repleto de desafios, crises e incertezas, o filósofo Byung-Chul Han nos convida …

Experiências como felicidade profunda ou amor apaixonado têm seu polo negativo. Esse polo forma o solo onde elas enraízam e florescem. Sem profundidade, não há altura. Até mesmo o amor é paixão. Por isso, Simone Weil eleva o sofrimento à condição de possibilidade do amor: “Somente em meio ao sofrimento eu senti a presença de um amor como aquele ser e ter que se lê no sorriso de um rosto amado”10. Sem negatividade, não há intensidade possível. Ao like universalmente difundido, ao qual a experiência hoje se atrofiou, falta a negatividade. O like é a fórmula básica do consumo. Negatividades ou intensidades escapam ao consumo. A esperança também é uma intensidade. Ela representa uma íntima oração da alma, uma paixão que desperta diante da negatividade do desespero.

O espírito da esperança by 

Byung-Chul Han: O espírito da esperança (Portuguese language, Editora Vozes) No rating

Em um mundo repleto de desafios, crises e incertezas, o filósofo Byung-Chul Han nos convida …

Na Epístola aos Romanos, está escrito: “A esperança que se vê não é esperança; porque o que alguém vê, como o esperará?” (Rm 8,24). A modalidade temporal da esperança é o ainda-não. A esperança abre-se para o vindouro, para o ainda-não-ente. Ela é um estado de espírito, uma afinação do espírito que nos eleva além do já dado, além do já existente. Segundo Gabriel Marcel, ela está entretecida na “trama de uma experiência em vias de devir”, de uma “aventura ainda não concluída”7. Ter esperança significa “dar crédito à realidade”8, crer nela, de modo a torná-la prenhe de futuro. Isso nos torna credores do futuro. Por outro lado, o medo nos tira toda a crença, retira da realidade todo o crédito e, assim, impede o futuro.

O espírito da esperança by 

Byung-Chul Han: O espírito da esperança (Portuguese language, Editora Vozes) No rating

Em um mundo repleto de desafios, crises e incertezas, o filósofo Byung-Chul Han nos convida …

A esperança também precisa ser diferenciada do “pensamento positivo” e da “psicologia positiva”. Em rejeição à psicologia do sofrimento, a psicologia positiva tenta se ocupar exclusivamente com o bem-estar e a felicidade. Pensamentos negativos devem ser imediatamente substituídos por pensamentos positivos; portanto, o objetivo da psicologia positiva é aumentar a felicidade. Aspectos negativos da vida são completamente desconsiderados e o mundo é representado como um grande armazém, onde obtemos tudo o que pedimos. Segundo a psicologia positiva, cada um é o único responsável por sua própria felicidade. O culto à positividade faz com que pessoas que estejam passando por um mau momento se culpem, em vez de responsabilizar a sociedade por seu sofrimento. Reprime-se o fato de que o sofrimento sempre é socialmente mediado. A psicologia positiva psicologiza e privatiza o sofrimento, deixando intocado o contexto de ofuscação social que causa o sofrimento. O culto à positividade isola as pessoas, torna-as egoístas e desmantela a empatia, porque as pessoas não se interessam mais pelo sofrimento dos outros. Cada um está preocupado apenas consigo mesmo, com sua própria felicidade, com seu próprio bem-estar. O culto à positividade no regime neoliberal dessolidariza a sociedade. Ao contrário do pensamento positivo, a esperança não vira as costas para as negatividades da vida. Ela permanece ciente delas. Além disso, ela não isola as pessoas, mas as conecta e reconcilia. O sujeito da esperança é um nós.

O espírito da esperança by 

Byung-Chul Han: O espírito da esperança (Portuguese language, Editora Vozes) No rating

Em um mundo repleto de desafios, crises e incertezas, o filósofo Byung-Chul Han nos convida …

O pensamento esperançoso não é otimista. Ao contrário da esperança, ao otimismo falta qualquer negatividade. Ele não conhece dúvidas nem desespero. A pura positividade é sua essência. Ele está convencido de que tudo ficará bem. Para o otimista, o tempo é fechado, então, o futuro como um espaço aberto de possibilidades é desconhecido para ele. Nada acontece. Nada o surpreende. O futuro lhe parece disponível. No entanto, é inerente ao autêntico futuro sua indisponibilidade. O otimista nunca olha para a distância indisponível. Ele não conta com o inesperado ou com o incalculável. Ao contrário do otimismo, que não carece de nada, que não está a caminho, a esperança representa um movimento de busca. É uma tentativa de ganhar apoio e direção. Nisso, ela também avança para o desconhecido, o não trilhado, o aberto, o que ainda-não-é, ultrapassando o sido, indo além do já existente. Ela se dirige ao não nascido e põe-se a caminho do novo, do completamente diferente, do nunca sido. O otimismo não precisa ser primeiramente conquistado. Ele já está aí, de maneira tão autoevidente e inquestionável quanto a estatura ou as características inalteráveis de uma pessoa: “Assim, o otimista está acorrentado à sua alegria, assim como o condenado das galés ao seu remo – uma perspectiva bastante desoladora”4. O otimista não precisa fornecer motivos para sua atitude. A esperança, por outro lado, não tem uma presença autoevidente. Ela desperta. Com frequência, precisa ser chamada, invocada. Ao contrário do otimismo, que carece de determinação, a esperança ativa é caracterizada por um comprometimento. O otimista não atua por conta própria. Toda ação sempre envolve um risco. O otimista, contudo, não arrisca nada. O pessimismo não difere fundamentalmente do otimismo. É sua contraparte espelhada. Para o pessimista, o tempo também é fechado. Ele está encerrado no “tempo como prisão”5. O pessimista rejeita tudo categoricamente, sem aspirar à renovação, sem permitir-se mundos possíveis. Ele é tão obstinado quanto o otimista, e tanto o otimista como o pessimista são cegos para possibilidades. Eles não conhecem nenhum evento que daria uma virada surpreendente ao curso das coisas. Eles não têm a fantasia do novo, a paixão pelo jamais sido. Quem tem esperança aposta em possibilidades que apontam além do “pessimamente existente”6. A esperança nos capacita a escapar do tempo fechado como prisão.

O espírito da esperança by  (11%)

Theodor W. Adorno: Introdução à dialética (Paperback, Português language, 2012, Unesp) No rating

Dialética é uma orientação na filosofia cujas motivações se entrelaçam com a própria origem do …

até mesmo um método que, considerado in abstracto, é o mais avançado método de pensamento, acarretará em algo de falso, quando aplicado mecanicamente, isto é, quando os fatos são simplesmente subsumidos a ele, sem que a experiência ou a intelecção [Einsicht] dos próprios fatos interrompa esse processo de subsunção. Quase incorrendo num paradoxo, poderíamos dizer que, no instante em que a dialética é praticada como um tipo de ofício manual, tal como se estivéssemos seguindo uma receita e, portanto, quando está, enquanto método, sendo manipulada, que então ela terá já se convertido necessariamente em inverdade - e bem no sentido dialético estrito de que ela mesma com isso terá entrado em contradição com seu próprio conceito. Pois, de fato, pensar de modo dialético significa justamente pensar por rupturas, por assim dizer. E isso significa pensar de tal maneira que o conceito encontre em cada caso sua crítica, num sentido enfático, por meio daquilo que ele pretende ter compreendido sob si e que, de modo inverso, a mera facticidade seja justamente medida a partir de seu próprio conceito. Assim, no instante em que nos distanciamos disso, em que não// mais empreendemos aquilo que noutra passagem fora chamado de "trabalho e esforço do conceito"; no momento em que, então, acreditemos estar em posse definitiva do método, já o teremos distorcido e condenado ao malogro. Trata-se, de resto, de algo bem generalizado, tal como se pode encontrar, por exemplo, de maneira recorrente, na arte, aquilo que Kandinsky certa vez formulou de maneira elegante em seu livro Sobre o espiritual na arte, a saber: que um artista, no momento em que acredita ter encontrado a si mesmo, em que crê estar definitivamente em posse de seu estilo, geralmente já o terá perdido. Vocês podem, nesse ponto, perceber de novo algo da atmosfera da dialética que é muito importante: dito concretamente, aquela oposição à necessidade de segurança, oposição da qual, a propósito, já lhes falei anteriormente. 81 Um dos desafios postos pelo pensar dialético, e talvez não o menor, é justamente aquele segundo o qual, quando pensamos dialeticamente, não podemos simplesmente falar como um professor escolar de estilo kantiano: "agora eu possuo o método, e uma vez o tendo em mãos, então nada mais pode me acontecer". Foi justamente contra essa representação do método, a de que se pode simplesmente continuar acochambrando as coisas, perseguindo o método de maneira em certo sentido automatizada, cega, em vez de levar a termo, a todo instante, o esforço contido no pensamento - foi justamente contra isso, eu dizia, que Hegel se voltou energicamente. Mas tais percepções [Einsíchten] são naturalmente bastante modestas e comedidas, embora seja extraordinariamente mais difícil comportar-se realmente de acordo com elas ao se pensar concretamente do que quando se as toma assim, em abstrato. Não há a menor garantia de que, também quando se pensa dialeticamente, esse mesmo pensar dialético não se transforme em uma embaraçosa repetição do truque de cartas acerca do qual Hegel adverte tão insistentemente. E é muito importante que, como seres humanos pensantes, nós de antemão nos condicionemos a atuar obstinadamente contra toda aplicação mecânica das nossas próprias categorias - em outras palavras: que nos disponhamos continuamente a refletir sobre nossas próprias categorias, a verificar // se tais categorias ainda são, de fato, apropriadas às coisas a serem pensadas por meio delas.

Introdução à dialética by  (Page 168 - 170)

Theodor W. Adorno: Introdução à dialética (Paperback, Português language, 2012, Unesp) No rating

Dialética é uma orientação na filosofia cujas motivações se entrelaçam com a própria origem do …

O ser-em-si é a determinação de uma coisa tal como ela é, enquanto ela não fez ainda reflexão dentro de si mesma. O conceito de ser-para-si podemos compreender, por seu turno, de maneira relativamente simples, caso o tomemos em sentido bastante literal. "Para si" significa aí não apenas aquilo que é apartado do todo, separado - ainda que esse momento de separabilidade [ Getrenntheit] desempenhe neste contexto um papel essencial-, mas também efetivamente aquilo que se pretende dizer, por exemplo, quando alguém afirma o seguinte: este homem é em si um cafajeste, porém para si é muito decente, isto é, ele simplesmente não acha que é um cafajeste, não sendo nem mesmo capaz de perceber, por pouco que seja, seu mau caráter e vilania; ao contrário - por narcisismo, diriam os psicólogos - continua a se achar um ser humano maravilhoso. Ele é para si, portanto, um ser humano maravilhoso, mas em si é um cafajeste, quer dizer, segundo sua determinação objetiva, tal como ela se expressa, digamos, em sua função social. A filosofia hegeliana, a qual trata essencialmente, como toda dialética, do sujeito e do objeto, ou seja, que considera que o subjetivo e o objetivo estão separados um do outro, incumbe-se da tarefa de comprovar justamente essa diferença entre ser-em-si [Ansichsein] e ser-para-si [Fürsichsein], embora possa para isso trilhar caminhos diversos. Na Lógica, trata-se do caminho que consiste em avançar do ser-em-si, passando pelo ser-para-si e se colocando, finalmente, na direção do ser-em-si-e-para-si [Anunclfürsicbsein]; na Fenomenologia, o caminho é precisamente o inverso, isto é, consiste em partir da subjetividade, a qual chega então à consciência de si mesma, ao ser-para-si e, apenas atravessando essa consciência e todas as reflexões que lhe são vinculadas, chega-se ao ser-em-si e ao ser-em-si-e-para-si. Nisto, a saber, que essa oposição de ser-em-si e ser-para-si esteja posta aqui com toda essa seriedade, reside já o tema real e altamente decisivo da determinação objetiva, segundo o qual os seres humanos - e a filosofia hegeliana é, segundo sua origem, uma filosofia humanista-, pela função que objetivamente desempenham na sociedade, não são ainda idênticos consigo mesmos. Dito de outro modo, o papel social, caso eu possa exprimi-lo de uma maneira mais moderna, enquanto ser-em-si das pessoas, e a consciência delas, o ser-para-si, divergem um do outro. E mesmo essa divergência, por conseguinte, essa não identidade dos seres humanos com seu próprio mundo - que justamente por isso não é ainda, de maneira nenhuma, seu mundo propriamente dito -, tal é precisamente o fundamento daquela situação conflituosa, daquele sofrimento, daquela negatividade, a qual, tal como eu lhes disse anteriormente, somente pode ser ultrapassada pelo trabalho, paciência, seriedade e esforço do conceito.

Introdução à dialética by  (Page 157 - 159)

reviewed Hegelianismo by Robert Sinnerbrink (Pensamento Moderno)

Robert Sinnerbrink: Hegelianismo (Portuguese language, 2016, Editora Vozes) No rating

Este livro pretende introduzir um dos mais ricos movimentos da filosofia moderna. O hegelianismo apresenta …

Pouco Hegel, muito Hegelianismo

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Eu entendo que esse é um livro sobe o Hegelianismo e não sobre Hegel mas fico triste que apenas 60 páginas falam diretamente sobre Hegel e o restante das 300 sobre filósofos e movimentos influenciados por Hegel. Eu estava em busca de algo para me preparar para a leitura da Fenomenologia do espírito e não sinto que este livro me ajudou tanto. Agora se você está em busca de um livro para entender um pouco mais a historia da filosofia esse livro é um ótimo resumo de uma corrente filosófica.